terça-feira, 29 de novembro de 2016

Um moinho goês de masala (Fatorn)

Tive a grata surpresa de me ser oferecido um moinho de pedra para especiarias, que tinha vindo há várias dezenas de anos de Goa portuguesa.
Uma amiga de um amigo meu, tendo conhecimento do meu sonho de fazer um museu de objectos de mesa e cozinha pensou que eu era a melhor pessoa para receber este objecto com cerca de 50 quilos.
Foto em Goa tirada da internet
A sua informação era de que a designação do objecto seria «rogró», de acordo com uma publicação de que me facilitou cópias. Parecia fácil pesquisar mas a palavra não aparecia em lado nenhum.
Depois de vários dias na pista do objecto percebi que não ia ser assim tão fácil. Na realidade a ideia de moer cereais e especiarias utilizando duas pedras é tão antiga como o homem e encontram-se na natureza escavações em pedras que funcionaram como moinhos na pré-história.
Mercado em Goa. Foto tirada do Flick da autoria de joegoauk18
Podemos portanto encontrar uma variedade enorme de formas e sobretudo de designações para este tipo de moinhos.
Na nossa civilização são nos ainda familiares os almofarizes em pedra existentes até ao século XIX nas grandes cozinhas que serviam para moer muitos dos constituintes necessários para a confecção dos pratos. Em Portugal eram sobretudo feitos em mármore sendo colocados sobre grandes cepos de madeira.
Metate e mano para moer cacau. Foto tirada da internet
Mas voltemos ao objecto em causa. À primeira vista fez-me lembrar um Metate com um Mano, que conhecemos melhor, usado na América do Sul para esmagar os grãos de cacau para fazer chocolate.
Faathon. Desenho em http://tonferns.blogspot.pt/ da autoria de Tony Fernandes

Na Índia este tipo de moinhos são habitualmente feitos em granito sendo sobretudo usados para esmagar as especiarias indispensáveis à confecção dos pratos. Em inglês chamam-lhe «masala grinding» por ser usado para esmagar as especiarias utilizadas para fazer masala. Em Goa, de acordo com imagens de mercados publicadas na internet, podem encontrar-se três tipos de moinhos. O aqui apresentado feito com um pedra achatada, existe em vários tamanhos e designa-se Fatorn. Nele as especiarias são esmagadas com uma pedra cilíndrica, semelhante ao mano, designada Fatnicho Fator que, segura com as duas mãos, rola sobre a pedra horizontal.
Foto tirada da internet
Um outro tipo de moinhos de pedra é semelhante aos nossos almofarizes mas mais denso sendo apenas escavada uma cavidade central onde são introduzidas as especiarias. É designado Rogddo (daí a adaptação para rogró) ou Ghonnsuno e nessa cavidade é introduzida uma espécie de pilão, de forma ovóide, igualmente em granito chamado Ghonnsunneacho ou Rogddeacho.
O "meu" Fator e Fatorn
Existe ainda uma terceira espécie de moinhos de pedra, constituída pelo conjunto de duas pedras circulares que rodam sobre si e que e é usado para esmagar cereais, como arroz, trigo, etc. Chama-se Dantem e é em tudo idêntica à utilizada no Algarve até há alguns anos, igualmente para moer cereais como o milho.
Mó para cereais no Museu de Lagos
Num dicionário de Konkani-inglês encontrei as palavras: Fator, que significa pedra; Fator Vanttunchi que corresponde a moinho de pedra. Quanto às palavras Rogddo e Dantem era traduzidas por moinhos de cereais.
Para complicar mais as coisas pedras idênticas são usadas na Malásia onde em malaio estas pedras de moer se designam Batu giling.
Penso que podia ainda apresentar mais vocábulos noutras línguas para objectos idênticos mas, para quem não sabe nada do assunto, já falei demais.


PS. Agradeço à Isabel Faro a oferta do moinho que suscitou esta publicação.

2 comentários:

Luis Filipe Gomes disse...

https://www.facebook.com/Vintage.et.Industrial/videos/368499093499218/

Talvez já conheça mas achei interessante ainda sobre o tema da tecnologia.

Ana Marques Pereira disse...

Luís Filipe Gomes,
Agradeço a informação. Cumprimentos