terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

O Restaurante Ventura no Porto

 
É provável que o Resturante Ventura tivesse derivado do anterior Café Ventura, inaugurado em 1891, frente ao Suiço, uma vez que ambos se situavam na Rua Sá da Bandeira (actual Sampaio Bruno).

Foi seu proprietário Ventura dos Reis Brenha que no bonito cartão (1) publicado no jornal «Os Pontos», anunciava o serviço de almoços e jantares e o fornecimento de banquetes e soirées. O anúncio data de 1903 mas dez anos depois ainda o restaurante existia, porque o seu proprietário fez um pedido de alteração para obras à Câmara do Porto em 1913.
Nada consegui saber sobre o dono do restaurante tendo apenas constatado que o seu filho, Ventura dos Reis Brenha Júnior, foi viver para o Brasil, para o Rio de Janeiro, onde foi director de várias empresas, como a Casa Aliança de Cambios, Passagens e Turismo, a Casa Bancária Bordalo, Brenha, SA. e a Casa Bancária Fiscal Imobiliária SA. Faleceu no Brasil em Outubro de 1960.

(1) Executado na Litho. Nacional Malmerendas, nº 20-22, Porto, 20-22 (actual Rua Dr. Alves da Veiga). 

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Os dois Babinski

 
 O nome Babinski é familiar a todos os médicos, em especial aos neurologistas. O «sinal de Babinski» aprende-se nos primeiros anos da profissão e permite identificar determinado tipo de lesões neurológicas e, no século XIX, foi também usado para a análise de quadros de histeria. Esta semiologia foi valorizada pelo médico Joseph Babinski (1857-1932), célebre neurologista de origem polaca que trabalhou em hospitais parisienses. 
Foto da Wellcome Library
Este nome podia portanto constar apenas da história médica, mas o seu irmão mais velho, Henri Babinski (1855-1931) iria divulgá-lo noutros campos. Sendo engenheiro de minas exerceu a sua actividade em vários países como Itália, Guiana Francesa, Patagónia, Estados Unidos, Brasil, Sibéria, etc. Apesar de todas estas missões os dois irmãos, que tiveram sempre uma grande ligação, viveram juntos numa habitação em Paris, no Boulevard Haussman, que partilhavam nos intervalos destas actividades e, mais calmamente, após a sua reforma. Partilhavam inclusivamente os mesmos amigos, muitos deles médicos, como foi o caso de Egas Moniz.
A frugalidade alimentar na sua actividade profissional levou-o a interessar-se por gastronomia e em 1907 publicou a obra «Gastronomie Pratique. Ètudes Culinaires» sob o pseudónimo Ali-Bab, numa alusão a Ali-Baba, o herói das «Mil e Uma Noites». Em 1923 o autor aumentou a obra para cerca de 1000 páginas, transformando-se num volumoso livro que continuou a ser comercializado até aos dias de hoje, uma vez que se tornou num clássico. 

O meu primeiro Ali-Bab encomendei-o na Bertrand em 1975 e era já a 9ª edição, idêntica à de 1923 como todas as que se lhe seguiram. Foi nessa época que comecei a interessar-me por culinária clássica, mas sobretudo por gastronomia. É que o livro não é apenas um livro de receitas, embora estas constituam grande parte do livro. São receitas muito precisas a que eu recorria, tal como aos livros de Escoffier, quando tinha dúvidas. Percebia que estava ali toda a cozinha clássica francesa, uma espécie de bíblia. 
Mas o livro começava com um “Esboço gastronómico” onde fazia relato da evolução histórica da alimentação e do estado actual (à época) da gastronomia. E, ainda antes de entrar nas receitas, dedicava-se aos vários serviços de refeições até ao final do século XIX. 
O livro termina com um texto sobre «Tratamento da obesidade dos gourmands» que, numa época em que não havia ainda as preocupações de hoje, era verdadeiramente inovador. O tema, na realidade, traduzia um problema pessoal. O seu gosto pela comida fizera-o aumentar excessivamente de peso e foi nesse sentido que procurou receitas que o fizessem emagrecer. 
Nesta foto mais tardia de Henri Babinski é já visível a obesidade
Alguns anos mais tarde consegui arranjar uma 4ª edição, de 1925, com encadernação da época que me encheu de prazer. Hoje repousam as duas na estante, lado a lado, como dois irmãos. 

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Palestra: A Ginjinha Lisboeta

Uma vista à história e aos locais tradicionais de ginjinha em Lisboa, sem sair da cadeira.
Na 5ª feira, dia 20 de Fevereiro, às 18,30 no Museu da Cidade, ao Campo Grande.
Seguido por uma degustação de «Ginja sem Rival» da casa de ginjinha das Portas de Santo Antão.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

A Farinha Maizena

No século XIX a principal utilização do amido era como goma, para tornar a roupa mais brilhante e formatada após ser passada a ferro. Existem vários tipos de amido mas falamos hoje no conhecido amido de milho que é identificado mundialmente como sinónimo da marca «Maizena».
Nos Estados Unidos a primeira fábrica de amido de milho foi fundada por Thomas Kingsford, em Oswego, Nova Iorque, em 1849, que se manteria até 1903, sendo então destruída por um incêndio. 
Mas antes disso, um dos seus funcionários, Wrigt Duryea, mudou-se para Glen Cove e fundou, em 1855, a Duryea Starch Works. Mais tarde a sua família, que havia permanecido em Oswega, constituída pelo pai e patriarca, Hendrick Duryea e os seus numerosos irmãos (nove, dos quais um faleceu jovem), juntaram-se-lhe. 
Em 1881 a designação da fábrica passou para Starch Manufacturing Cº transformando-se na maior fábrica de amido, com mais de 700 empregados, numas extensas instalações representadas nas suas embalagens amarelas.
Em 1880 existiam nos Estados Unidos mais de 140 fábricas deste tipo, mas a grande maioria era de pequenas dimensões. Por essa altura os habitantes de Glen Cove já se queixavam da poluição provocada pela fábrica. 
Talvez por isso tenham acedido a juntar-se a outros fabricantes para formar a National Starch Manufacturing Company, em 1890, mais tarde designada Corn Products Company. Apesar do sucesso comercial com exportações para a Europa a partir de 1859, a família esteve ligada a várias tragédias. Em 1886 os dois filhos de Wright Duryea faleceram ainda crianças com dois dias de diferença e um dos seus irmãos, Hiram Duryea, foi morto a tiro pelo filho por alegadas perturbações mentais.
A avaliar pelo tipo de publicidade aqui apresentada, a Maizena deve ter entrado em Portugal no final do século XIX, depois de 1893, uma vez que nela surge referência à medalha de ouro ganha na Feira de Chicago, nessa data.
O primeiro registo em Portugal que encontrámos da «Maizena» data de 1907 e era referida como um produto nacional. Foi registada pela firma «Barretos & Marques» que eram industriais no Porto, com fábrica na Rua da Restauração. Seria uma representação ou uma cópia?
Apenas em 1913 a CONOPC, Inc., de Nova Iorque, fez o registo da marca Maizena com a representação gráfica habitual. Mais tarde, em 1930, a mesma firma registava a famosa embalagem amarela, tradicional e, em 1967, uma embalagem mais moderna com duas colheres de pau.
Maizena nome que vem de "maiz" o nome original deste tipo de milho
Presentemente a marca é propriedade da Unilever e tal como desde o final do século XIX encontra-se distribuída por todo o mundo, com estratégias diferentes de acordo com os hábitos dos países. 
Continua a ser utilizada em todas as cozinhas e eu pessoalmente não abdico dela para o béchamel e para as papas de farinha.
E já pensaram porque é que tratando-se de uma farinha de milho é branca e não amarela? Afinal é simples. Porque é utilizada uma estirpe de milho branco.


segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Calendário dos Chocolates Regina

 
Olhando rapidamente não se percebe o que faz uma fotografia de um diligente empregado de escritório neste blog.

A fotografia, tirada em Agosto de 1952, retrata o interior de um escritório na FNAT da Costa da Caparica, em que são visíveis os objectos destinados a essa actividade. Mas, como era habitual nos escritórios, não podia faltar um calendário de parede. 
Este era uma oferta dos Chocolates Regina, representando o que parece ser uma tampa de uma caixa de bombons, com a imagem de um menino, e que era  utilizado como forma de publicidade.
Está explicado o mistério.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Palavras esquecidas: Ladrilhos de marmelada

Nos últimos tempos algumas casas de doçarias retomaram a comercialização dos ladrilhos de marmelada.

Em Odivelas, local de origem de uma das mais famosas marmeladas, com receita primitiva no Convento de S. Dinis, sete pastelarias locais (1) associaram-se e começaram a comercialização desta doçaria de uma forma coordenada, de modo a uniformizarem as características. Uma das formas de apresentação da marmelada, na variedade branca, é em ladrilhos.
As recordações da minha infância trazem-me à memória as imagens da marmelada a secar em taças de louça, ao sol, cobertas com um papel vegetal. Lembro-me de a minha mãe dizer que para se obter marmelada branca havia que a bater muito mais tempo. Hoje há quem o faça com Bimby, esse aparelho adorado pelos portugueses.
Não havia o hábito de a servir em “quadradinhos”, ou “quartas”, sinónimos de ladrilhos, mas fazia-se um doce de marmelo aos quadrados pequenos metidos numa calda, que ficavam ligeiramente rijos e que continua a ser o meu doce de marmelo preferido.
Quanto aos ladrilhos, vim a encontrá-los mais tarde, já em Lisboa, e remetem-me imediatamente para as ceias do Hospital ou para os longos dias de urgência em que, para matar a fome, recorria a um desses quadradinhos. Vinham embrulhados em papel vegetal transparente com a identificação do produtor em letras coloridas. Eram também distribuídos aos doentes nas pequenas refeições e foram piorando de qualidade, tornando-se mais secos e um dia desapareceram.

É verdade que no Porto se manteve esta tradição em casas como a confeitaria Costa Moreira e provavelmente outras de que não conheço o nome. É nesta cidade que se associam ao vinho do Porto.
O mais interessante é que quando pesquisei a origem da palavra «ladrilho», vi que este vem do espanhol ladrillo (2) e este do latim laterrellu, que significa «tijolo, ladrilho». Contudo, para nós hoje a palavra ladrilho é sinónimo de mosaico e apresenta-se com a forma rectangular. Para os espanhóis, ladrilho é um tijolo e se meterem a palavra ladrillo no goggle vai-lhes aparecer a imagem de tijolos.
Mas os nossos ladrilhos de marmelada, obtido por cortes simétricos de um tabuleiro com o doce seco, são cúbicos.
Dá que pensar, não dá?
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1) Carolina Pinho, Pastelaria Espiga Doce, Ide vê-las, Pastelaria Viriato, Pastelaria El rei D. Dinis, Pastelaria Faruque e o Forno da Cidade.
2) Machado, José Pedro, Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa.