quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

O doce de bagas de sabugueiro

 

Durante este fim-de-semana estive em Castelo Rodrigo e tive o prazer de descobrir um doce que desconhecia. Ao pequeno-almoço, na agradável Casa da Cisterna, onde fiquei, foi-me apresentada uma variedade de doces e entre eles um doce escuro de que gostei muito. A proprietária, a Ana Berliner, disse-me tratar-se de Doce de bagas de sabugueiro, cuja confecção não parece ser das mais fáceis. Percebi depois porquê. É que as bagas têm que ser fervidas para perderem um produto tóxico que possuem, a sambunigrina, destruída pelo cozimento, antes da confecção do doce.

Castelo Rodrigo. Casa da Cisterna ao lado da cisterna medieval
Procurei saber mais sobre a utilização da baga do sabugueiro (Sambucus nigra), um arbusto da flora autóctone portuguesa, que se encontra por todo o país. As bagas podem também ser usadas na preparação de guisados, pastéis, bolos e tortas e outros produtos de panificação. São também utilizadas em compotas, geleias, gelatinas e em xaropes, licores, vinhos e chás.

O mais interessante é que se trata de uma planta de que se podem utilizar todas as partes, isto é, as cascas, raízes, folhas, flores e os frutos. De tal modo era considerado útil que no Brasil o sabugueiro era chamado “armário dos remédios”, devido aos seus múltiplos usos. Na realidade, ao longo dos tempos os extractos de sabugueiro foram usados para fins medicinais, culinários e cosméticos, desde os povos pré-históricos e sendo muito popular entre os gregos e romanos, o que explica que aquela planta fosse considerada como guardiã da saúde. Na medicina tradicional, o sabugueiro era usado para baixar o ácido úrico e reduzir a ocorrência de cálculos renais; em casos de febre de origem desconhecida; no combate a gripes, rouquidão e outras queixas respiratórias; dores de dentes, nevralgias, dores de ouvidos e de cabeça, etc.[1]

No entanto algumas partes da planta são ligeiramente tóxicas, como as folhas, a casca fresca, frutos verdes, enquanto os frutos maduros (ricos em vitamina C) e as flores podem ser usados. Quanto às bagas devem ser ingeridas preferencialmente secas, com moderação e de acordo com as indicações já referidas.

Em Portugal, a cultura do sabugueiro era levada a cabo já pelos monges de Cister, seguramente no Mosteiro de São João de Tarouca (séculos XII a XVIII) e pela população em geral, considerando este um produto excelente para fins culinários e terapêuticos, tendo-se perpetuado estes usos e costumes até hoje. Presentemente na região do Douro existem extensas áreas de produção de baga de sabugueiro, sob a denominação “Baga do Varosa”, reconhecida como sendo de qualidade e exportada para vários países.

No nosso caso ficámo-nos pelo docinho, de que tive o privilégio de trazer um fraquinho para casa e, não ficámos nada mal.



[1] Hoje existem estudos fármaco-toxicológicos que que lhe reconhecem algumas outras propriedades como anti-oxidantes e anti-inflamatórias.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

A exposição “Um cento de cestos”

Felizmente esta é uma exposição de longa permanência, porque os meus adiamentos podiam-me ter feito perde-la. Encontra-se no Museu de Arte Popular, um edifício maravilhoso, com ar abandonado, como se tivéssemos vergonha do que foi a estética do Estado Novo.

Entrada

 Faço votos para que ainda vamos a tempo de recuperar o que nos ficou dessa época e onde tantos e tão bons artistas colaboraram.

Parte do painel da sala
Utilizando exemplares do Museu de Arte Popular e do Museu de Etnologia, e tendo por base os estudos de Fernando Galhano, podemos ver mais de 300 cestos que, em grande parte, já não se fazem. As peças  são apresentadas por regiões e com indicação da sua utilidade.

Para mim uma exposição é mais do que um deleite visual, qualquer que seja o tema. Quero aprender com o que vejo. Por isso me irritam as exposições grandiosas, por vezes internacionais, com legendas mal traduzidas, informações superficiais e identificação que fica a um metro da obra, em que os curadores acham que a obra vale só por si.

Nesta exposição o conjunto de cestos tem placas que os identificam de forma fácil. Estão perto das obras, seguem o mesmo modelo em todas as vitrines e percebe-se, mesmo num conjunto grande de cestos, qual o seu nome, a região de proveniência e para o que serviam. Parece simples, mas para quem, como eu, já viu tantas exposições sabe que nem sempre é assim.

Pequeno cestinho para figos e doces
 Mostro aqui alguns modelos, alguns que eu já conhecia, mas a grande maioria foi uma agradável descoberta. Esta uma amostra de utensílios tão humildes, mas que foram tão úteis e que faz as pessoas olhar para eles com prazer e vontade de os preservar.

Não deixem passar, porque por vezes as exposições de longa duração são as mais fáceis de perder porque pensamos que vai lá estar mais tempo e quando damos por isso acabou. Vão ver!