sábado, 11 de novembro de 2017

Botelhas e Botelhocos

 
A minha versão adulterada do botelhoco
A minha amiga Adriana, transmontana dos sete costados, ofereceu-me na última vista uma refeição transmontana com casulas, botelhoco e entrecosto.
Nunca tinha comido botelhoco que na realidade é uma abóbora no estado imaturo que permite cozinhá-la com casca. É cortada em fatias e estufada com cebola, azeite e sal. Tão simples como isto. Mas para a fazer é evidente que tem que se ter este tipo de abóbora, nesta fase de maturação. 
Os transmontanos, tal como os alentejanos souberam contornar as dificuldades alimentares de forma inteligente. Se no Alentejo recorrem às ervas para condimentar ou servir de base aos pratos, em Trás-os-Montes utilizam os legumes ou as leguminosas em vários estádios de maturação. Isto é, utilizam-nos ainda verdes, ou nalguns casos em flor como com as abóboras; quando no seu desenvolvimento adequado e, por fim, secos, para as épocas mais difíceis.
Não sei dizer qual a variedade de abóbora utilizada mas mostro-lhes alguns exemplos das abóboras cultivadas pela minha amiga.
Depois desta refeição constatei que me faltava esta palavra no livro Do Comer e do Falar. Vocabulário Gastronómico, que escrevi em colaboração com outra amiga, a Graça Pericão. Vejamos então os vocábulos relacionados existentes no mesmo:
BOTELHA – Galicismo que designa um recipiente, geralmente de vidro, provido de um gargalo estreito e tapado com uma rolha onde se conservam bebidas ● Vinho ou licor nela contido ● Espécie de abóbora. Batefa. Cabaço. Colondro. Na Beira-Baixa designa o mesmo que Abóbora.
BOTELHA COM LEITE – Doce da Beira-Baixa feito com abóbora cozida (botelha) a que se junta leite e açúcar. Serve-se decorado com canela.
BOTELHEIRO – Pessoa encarregada da frasqueira e dos vinhos engarrafados.
BOTELHO (reg.) – Abóbora pequena (Riba Côa).
 Botelha” tem origem na palavra francesa bouteille, do latim butticula, segundo José Pedro Machado. Os nossos irmão espanhóis usam a palavra botella apenas para a garrafa de vidro, descrita no Dicionário de Autoridades (1726) como «Redóma de vidro mui doble negra, con el cuello angosto, que contendrá à lo mas dos ù tres quartillos de vino, las quales se usan oy mui comunmente para traher vinos de fuera y otros liquóres».

É verdade que também há quem chame nalgumas zonas transmontanas “botelho” ao “botelhoco”, em ambos os casos referindo-se a uma abóbora jovem, mas sendo assim devia surgir no nosso dicionário como sinónimo. Não me safo.
A palavra vai engrossar a lista das palavras que serão adicionadas se existir uma reedição e que entretanto vamos descobrindo. Fazem o favor compram o livro (que na minha opinião suspeita devia ser de leitura obrigatória nas escolas hoteleiras) para eu poder acrescentar o vocábulo na nova edição.

2 comentários:

álvaro silva disse...

Na terra da minha mulher, Sernancelhe, esse petisco chama-se abôboro (abobora imatura ) que se come com casca e sementes.
No Alto Minho a abóbora é chamada de cabaça, na zona de Viana chamam-lhe côco. O termo botelha é reservado para as do tipo cabacinha de Santiago que servia para levar o vinho para as fainas agrícolas ou romarias. Na minha meninice anos 50 e antes da massificação dos plásticos, as botelhas eram usadas pelos pescadores minhotos como bóias para sinalizar os extremos das redes. Meu pai referia ter aprendido a nadar com duas botelhas atadas ao tórax. Cumprimentos vianenses.

Ana Marques Pereira disse...

Álvaro Silva,
Muito obrigada pelas suas informações sobre regionalismos sobre abóboras que enriquecem os dados que já tínhamos. Cumprimentos.