Era suposto falar de uma livro de receitas portuguesas que adquiri. Trata-se de «As 500 melhores receitas para Cozinhar» de Olga de Albuquerque. Sem data de publicação, mas seguramente do início do século XX viria a ser seguida por uma outra publicação da mesma autora, em 1953, intitulada O Prazer da Mesa, que tal como o anterior se definia como um livro de «receitas práticas, ensinadas pela imagem e pelos processos ultramodernos».
No entanto não é sobre o livro que eu quero falar mas sim sobre um anúncio que surge na última página.
Refiro-me à publicidade ao fogão norueguês, o «fogão que não gasta combustível». Este era vendido na Rua da Hera, 17, em Lisboa, pela quantia de 200$00, sendo salientado com o seu uso a economia obtida tanto em combustível como em tempo, sem o risco de queimar os alimentos e tornando os alimentos mais saborosos.
De que falamos então? Trata-se do que em França e na Bélgica era conhecido como “marmite norvégienne” (ou fogão sem combustível ou auto-cozinha) que era uma caixa isolante, cujo principio de funcionamento não se afastava muito do de uma garrafa térmica. O isolamento da caixa permitia que o prato, iniciado ao lume num fogão normal, interrompesse o seu cozimento para acabar de cozer no seu próprio calor, durante horas, dentro de uma caixa estanque. O calor não podendo sair da caixa hermética, permitia um acabamento lento do prato.
Não se surpreendeu o princípio. Lembro-me de em minha casa se fazer um arroz, que após um cozimento inicial ao lume, se embrulhava em jornais e ia cozendo a pouco e pouco. Utilizava-se este método para pic-nics ou em casa. Eu própria quando me lembro, e não estou em cima da hora, procuro fazer isso.
Quando há alguns anos falei com uma doente minha sobre o início da electrificação ela referiu-me que se lembrava de em pequena existir em sua casa uma «caixa de serradura», isolante, que não era mais do que um fogão norueguês. Fiquei então a saber que se tinha utilizado em Portugal mas não tinha ainda encontrado publicidade ou referência e este método.
Sabe-se que este tipo de fogão existiu em França desde 1870, precisamente por ter sido referido numa revista com essa data. Teve grande divulgação durante a guerra de 1914-1918 e em 1938 ainda era ensinado o seu uso em aulas nas escolas francesas.
Ficou esquecido entretanto. Mas em 2004, no Salão da Água e da Ecologia da Casa, fez furor um stand sobre economia de energia intitulado «Négawatts» em que se apresentava um cubo com isolamento, com cerca de 50 cm destinado a meter os tachos para acabar de cozer a comida.
Associações como «Les amis de la Terre» começaram a defender o seu uso uma vez que a redução do consumo de energia com este método vai de 50 a 75%, com grandes vantagens sobretudo em países com problemas de energia. Hoje é possível encontrar na net vários sítios que ensinam a fazer o próprio fogão norueguês, bem como receitas para o mesmo, entre as quais algumas elementares como ensinar a fazer em casa os próprios iogurtes.
Imagem extraída do livro «Cuisine Auto-Cuiseur» de 1917 |
Em tempo de crise, e perante as medidas de austeridade agora apresentadas pelo governo, faz sentido voltar atrás no progresso e apresentar um fogão que a ecologia e o bom senso recuperaram.
É esta a verdadeira «slow food».
2 comentários:
Belo texto. Para os aproveitamentos também temos o fogão solar, produzido por um Português na zona da Moita, e que não é muito divulgado. Já o vi em funcionamento, a preparar o almoço do feirante e funciona mesmo.
Abraço amizade
Carlos Caria
Carlos Caria,
A sua observação é muito pertinente. Não falei no fogão solar mas ele anda de mãos dadas com o norueguês sendo ambos defendidos e implementados pelas mesmas associações ecológicas.
Um abraço
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