quarta-feira, 19 de novembro de 2008

O Absinto (II)

Para terminar este tema, voltamos ao absinto, a bebida conhecida por «fada verde» devido à sua cor e ao poder alucinogénico.

Na realidade foi também este o nome que o seu inventor comercial, o médico Dr. Pierre Ordinaire lhe deu quando o criou, em 1792, como remédio para todos os males.

No entanto e apesar da presença de ervas destiladas a sua cor verde só se torna mais evidente após a preparação.
Para a confecção da bebida existem vários utensílios. Em primeiro lugar a garrafa que contém a bebida destilada e de que, em cada bebida, apenas se utiliza uma pequena parte, isto é, uma medida, uma vez que em si o «absinto» é o que hoje chamaríamos uma «long drink». Essa medida é colocada num copo de vidro alto, ligeiramente cónico, assente num pé curto. Existem vários modelos de copos e alguns apresentam uma pequena barriga inferior, que corresponde à medida correcta de absinto. Outros modelos incluem uma segunda peça em vidro que encaixa no próprio copo, mas este modelo foi menos frequentemente usado.
Indispensável era a garrafa de água fresca usada na preparação da bebida ou o jarro de bico fino, para permitir deitar a água lentamente. Esta era deitada em fio sobre um cubo de açúcar colocado sobre uma colher perfurada, assente horizontalmente nos bordos do copo.

A primeira vez que vi uma colher destas (a 1ª da foto) foi na Feira da Ladra, há alguns anos. Passei a correr e vi um objecto estranho que eu desconhecia. Perguntei o que era, mas o vendedor também não sabia. Pensei que talvez servisse para peixe.

Como sempre faço quando não sei para que serve, comprei as quatro que estavam à venda, para mais tarde descobrir a sua função.
Ao chegar a casa limpei-as e tive a primeira surpresa agradável: eram Crhistofle. Um dia, nas minhas pesquisas, venho a descobrir que se tratava de uma colher de Absinto. Fiquei fascinada e li o que podia sobre o assunto. Em Bruxelas encontrei mais dois modelos em metal. Existem porém dezenas de colheres deste tipo com diferentes recortes, algumas delas publicitárias. Para além deste modelo, existe um outro circular com aberturas e que assenta em 3 ganchos no bordo do copo e ainda um outro, em que a colher tem o aspecto normal, mas no seu cabo, surge a meio um rendilhado destinado a colocar o açúcar.
Em qualquer dos modelos existia um local perfurado onde se colocava o açúcar que, lentamente, sob a acção da água ia derretendo. Á medida que esta água se adicionava ao absinto a bebida ia tomando uma cor verde opaca. Escorria-se depois a colher e mexia-se. Tudo isto era feito de uma maneira lenta, constituindo um ritual valorizado por si só.

Como se utilizava o açúcar, uma vez que a bebida em si é amarga, havia tendência para que algum escorresse pelo copo, pelo que sempre se colocava um pequeno pires, em louça, sob este. Esses pires tinham em França rebordos coloridos que variavam de acordo com a quantidade e qualidade do absinto. A cada uma dessas cores correspondia um preço e alguns pires têm mesmo o preço escrito, em francos.

Em Portugal bebeu-se também absinto embora seja difícil saber qual foi a sua divulgação. Júlio Dinis na sua obra «Uma família inglesa» referiu-se a Mr. Richard Whitestone como sendo um desses casos.
Mas a publicidade do absinto era também dirigida às mulheres. Picasso pintou vários quadros em que surge o absinto e, num deles «A bebedora de Absinto» (1901), presentemente no Hermitage de S. Petersburgo, pode observar-se uma mulher sentada à mesa a preparar a sua bebida.

A presença das mulheres tanto na publicidade ligada ao absinto como em bares, numa época de grande austeridade de conceitos e em que a mulher procurava emancipar-se reforçou a perseguição a esta bebida, que terminaria com a sua proibição. Não se acredite que esta foi a razão mais forte.
A pressão dos viticultores, prejudicados com este comércio, viria a ser determinante. O prato da balança económica pendia agora para o seu lado.

«A bebedora de absinto», quadro de Edgar Degas (1876)

5 comentários:

-pirata-vermelho- disse...

Poderes alucinogéneos, madame; será mito ou tem que ser 'os litros?

Anónimo disse...

Interantissimo este post sobre o absinto. As colheres são lindas e o seu fim dificilmente identificavel.

Estou tentada a utilizar urtigas na culinária já que o absinto é forte.

(o absinto que se vende hoje em dia não é igual ao do séc. XIX, ou é??)

Ana Marques Pereira disse...

O absinto comercializado hoje em dia, embora tenha como base a planta Artemisia absinthium L., é um licor inofensivo. O mais conhecido em Portugal é o das Caves Costa Neto. Admiro-me como nenhum cozinheiro inventou ainda uma daqueles molhos decorativos,em fio, que rodeiam os doces e acrescentou na longa descrição do nome «com molho de absinto».

Rafael Aquino disse...

ola.. poderia me vender uma colher destas? ou quem sabe trocar em troca de uma garrafa de absinto artesanal??

meu email eh rafael.lfa@gmail.com

abraco

Ana Marques Pereira disse...

Olá Bom dia,
Lamento mas não tenho colheres de absinto em quantidade ou variedade para poder vender ou trocar. Vendem-se cópias pela internet. As antigas são difíceis de arranjar mas encontram-se em feiras em França e na Bélgica.