sábado, 15 de junho de 2019

Monólogo gastronómico no «Restaurante Sua Excelência»


 No meio de alguns papéis com receitas que me deram vinha uma fotocópia de um artigo de um jornal não identificado intitulado «Monólogo gastronómico».
O papel mostrava a fotografia de Francisco Queiroz e reproduzia na íntegra uma das suas recitações da ementa que antecediam a refeição. O nome do restaurante não era referido no recorte (possivelmente incompleto), mas imediatamente fui transportada para o interior de «Sua Excelência». O restaurante, que já não existe, ficava em Lisboa na Rua do Conde, nº 38, onde na altura eu vivia, um pouco mais abaixo.
Rua do Conde, 38, já com o resturante fechado. Foto tirada do Google Maps.
Fui lá algumas vezes, talvez não tantas como se justificava, porque era um lugar onde nos sentíamos em casa. Morando eu tão perto ficava com a sensação de não tinha saído de casa e que aquela era a minha sala de jantar. Coisas da juventude, porque as refeições eram realmente diferentes das dos outros restaurantes. Em primeiro lugar a comida era excelente, o ambiente acolhedor e o seu proprietário, Francisco Queiroz, recitava-nos as receitas dizendo, por exemplo, «nabos à moda da minha avó». A propósito, eu que não gostava de nabos fiquei tão encantada com a descrição da receita que resolvi experimentar. Os nabos vinham numa frigideirinha de cerâmica cobertos com fiambre e molho branco e iam ao forno gratinar com queijo. A sua confecção era descrita passo a passo e a experiência era sempre positiva. 
A recitação da ementa era uma das características da casa. Francisco Queiroz descrevia todos os pratos em pormenor, referindo logo que não havia ementa escrita e a que ementa era ele.
Francisco Queiroz
A demorada descrição fazia impacientar algumas pessoas. Mas não havia volta a dar. Era um ritual que fazia parte da refeição e que para ele fazia parte do prazer do momento. Quem lá ia já sabia ao que ia e se fosse bom ouvinte tirava disso prazer.
Tendo vindo de Angola nos anos 70 começou por abrir o restaurante «Varina da Madragoa» onde já fazia esta “actuação”. Quando frequentei este restaurante já ele lá não estava e não o posso confirmar pessoalmente.
O artigo que reproduzo fala apenas das entradas, podem imaginar o resto. Mas tudo isto valia a pena. Já não há restaurantes destes!

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