A maior parte das vezes
olhamos para as coisas e só vemos uma parte. Isto é, recebemos a mensagem e
aceitamo-la como se nos apresenta. É a diferença entre olhar e ver. Este “ver”
pressupõe análise.
Foi o que me aconteceu com uns
cromos publicitários de chocolate em que se reproduz um almoço do rei Luís XIV
com Molière.
François-Jean Garneray. |
Os cartões pecam pela
incorrecção histórica com a imagem do rei de costas, o rei sentado no lado mais
estreito da mesa, ou a presença de copos sobre a mesa, entre outras.
Mas onde é que os
publicitários da época foram buscar a inspiração? No final do século XIX e
início do século XX havia um gosto pelo historicismo, com o uso de imagens “à
antiga” em cartazes publicitários. Dois dos cartazes de publicidade ao vinho do
Porto Rainha Santa, que fazem parte da minha colecção, apresentam essas mesmas características.
Jean Hégesippe Vetter |
O sucesso do livro foi seguido
por representações imaginadas por vários pintores. Assim, no salão de 1824, podiam-se
já admirar duas versões desta refeição: a de Édouard Pingret e a de de
François-Jean Garneray. O tema foi retomado posteriormente por Ingres em 1857 e
por vários outros pintores, entre os quais Jacques-Edmond Leman, em 1863 e Jean
Hégesippe Vetter, em 1864.
Reprodução do quadro de Ingres que desapareceu num incêndio |
No final, os erros históricos
já não podem ser atribuídos aos encarregados de divulgar as marcas de chocolate,
mas aos pintores que, no século XIX, imaginaram o cenário deste improvável
acontecimento. Molière seguramente que encenaria melhor esta cena.
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