quarta-feira, 11 de julho de 2012

O torrão espanhol

Quando eu era pequena e íamos a Espanha era inevitável que trouxessemos caramelos. Os “caramelos espanhóis” eram uma instituição. Nem me lembro qual era a marca porque eram apenas assim chamados.
Era um doce que se colava aos dentes e que não era fácil de comer mas todos os portugueses os adoravam. Houve um período em que, na Covilhã, batiam à porta umas ciganas que vendiam latas de «melocóton» e caramelos espanhóis de contrabando, claro. E as pessoas compravam, contentes por reforçar a sua despensa com produtos de dias de festa.

Hoje os mais novos já não conhecem estes caramelos que já ninguém compra. Foram substituídos pelo torrão espanhol (turron em castelhano), tal como eu fiz agora numa curta visita a Barcelona. Contudo o torrão é bem mais antigo que os caramelos. O torrão é um doce que leva na sua confecção mel, açúcar, claras de ovo e amêndoas ou avelãs.
Esta especialidade tem uma origem árabe e foi uma herança dos muçulmanos que estiverem em Espanha, embora existam também em Itália e na bacia do Mediterrâneo. Ainda hoje nos países árabes há vários doces parecidos com estes, chamados halva, que em árabe significa “doce”.

O torrão (torró em catalão) que eu comprei é de Agramunt que fica na província de Lérida, na Catalunha. É um produto com «Indicação Geográfica Protegida» identificada por um selo de autenticidade. É, a par dos torrões de Alicante e Jijona, um dos mais conhecidos. O de Alicante é uma variedade dura e o de Gijona pertence à variedade mole, ao contrário do que poderíamos pensar quando nos lembramos do slogan: «O torrão de Alicante mete-se na boca e derrete-se num instante», como muitos recordarão.
O torrão de Agramunt é feito com avelãs que predominam na região e apresenta-se com forma circular sobre obreias. Comprei no entanto as formas clássicas de amêndoa, rectangulares, de pasta dura e mole que aqui lhes mostro.

No fundo o torrão é uma variante do nogat, que, este sim, faz parte das nossas tradições doceiras, sob a forma de pinhoadas, como as de Alcácer do Sal e nogados.
A marca que comprei foi a «Vicens» que existe desde 1775. A destruição dos ficheiros de Agramunt na guerra napoleónica não permite confirmar a sua existência anteriormente a esta data. É contudo muito provável que assim seja. Aliás todos os doces com mel, predominantes na Idade Média, precederam os doces com açúcar.
Eu sei que temos doces muito bons. Na realidade os melhores do Mundo. Mas não faz mal elogiar os dos outros, sobretudo quando estão bem protegidos e com identificação de origem. Quantos dos nossos doces comercializados apresentam como cartão de visita uma origem confirmada desde o século XVIII? 

3 comentários:

T disse...

Ainda sinto o gosto dos caramelos espanhóis. E também do torrão, salvo erro era o de Alicante, que o meu pai trazia sempre das viagens aos vizinhos. E as louças amarelas de vidro, latas de pêssegos e de alcachofras, um mundo de coisas boas.\

Ana Marques Pereira disse...

T,
Ainda se lembra!
Um abraço

Unknown disse...

Comia caramelos fom a marca "5La Cabra" e eram muito bons. Talvez por ter o gosto da infância algures perdida...