Irene Frias no Restaurante Casa D'Irene
Regressei a Castelo Rodrigo para mais um lançamento de um livro do meu amigo Álvaro de Carvalho, intitulado «Às oito menos um quarto». Nele relata as memórias da sua aldeia de Mata de Lobos centradas no Largo da Igreja de onde partia, a essa hora, a camioneta que transportava os seus habitantes para a Guarda e daí para o resto do mundo.
Saída do passado, a camioneta da carreira regressou impecável ao Largo para gáudio das centenas de seus amigos que ali se deslocaram, na grande maioria vindos de Lisboa,
Na Casa da Cisterna, onde fiquei, aconselharam-me o almoço no restaurante «Casa d’Irene», que fica em em Malpartida, uma aldeia entre Almeida e Castelo Rodrigo.
Não costumo falar em restaurantes mas achei que este merecia. Tal como acontece com a pessoa responsável pelo mesmo, uma mulher dinâmica e honesta. Chama-se Irene Frias e tem 62 anos. Também ela um dia partiu numa outra camioneta para a França onde ficou por dez anos. Regressada na década de 1980 decidiu abrir uma pequena mercearia no Largo do Almo e mais tarde, um restaurante anexo. Cozinha por intuição recordando pratos antigos da sua região. Extremamente organizada, tem duas ajudantes que trabalham na cozinha e servem à mesa, com modos informais e agradáveis.
Irene Frias não aderiu às novas modas culinárias. O que ali se come é a verdadeira comida portuguesa, sem invenções, mas feita a preceito.
A ementa é variável e no dia em que lá comemos escolhemos um caldo verde e favas guisadas com entrecosto, servido como entrada, em prato mais pequeno.
Seguiu-se uma travessa (já tinha saudades das travessas) com carnes mistas assadas acompanhadas por batatas à pobre ou, em alternativa, batata palha. Claro que só comi as «batatas à pobre», uma das especialidades da região. Segundo nos contou Irene, a sua mãe e as gentes da região faziam-nas quando as batatas começavam a escassear e apareciam os nabos.
Fritam-se alhos numa gordura (toucinho ou unto) e junta-se a rama do nabo cozido e as batas cozidas esmagadas com um garfo.
Uma delícia que eu já tinha experimentado num almoço que comi há uns anos em Meda e que foi uma das melhores experiências gastronómicas da minha vida. Ainda na véspera tinha recordado essa refeição e foi um prazer reencontrar esta receita de batatas, simples, mas extremamente agradável.
Tinham-me avisado para deixar espaço para as sobremesas, que nesta altura da refeição já se tornam supérfluas. Mesmo assim não resisti. Para escolha existiam as receitas tradicionais de leite-creme, arroz doce, pudim de ovos, farófias, e requeijão com doce de abóbora.
Rendida com a qualidade dos produtos e o sabor das confecções fui à cozinha falar com a responsável por aquele almoço tão agradável.
Deparei-me com uma mulher inteligente e simples, com uma sensibilidade que explica o seu sucesso. Sem qualquer aprendizagem no campo da culinária, contrapõe-se a esta corrente de abundância de “chefes” que agora nos rodeiam. Foram as suas características naturais que a guiaram neste caminho de autenticidade e a levaram a preservar as nossas receitas e a proporcionar-nos momentos de prazer. E só posso agradecer-lhe este regresso aos sabores antigos.
7 comentários:
Gostei dessa receita das batatas à pobre. Devem ficar bem também com azeite, não?
T,
Sim. Hoje são feitas com azeite, mas a receita mais antiga era com toucinho. O que acontece é que nós comemos as batatas a acompanhar com carne e antigamente este era um prato único.
Calculo que com toucinho ou banha devessem ficar mais saborosas:)
É tão grande o bom gosto que denotas como a boa escrita que debitas.
Um beijo de 'parabem'.
Salvador
(este sistema de filtragem para 'segurança' é óptimo - as palavras de código são ilegíveis e impede que use o meu nome de registo, demonstrando que não sou um boneco animado - parabem, não sei de quem!)
Nossa.. Em primeiro lugar parabéns pelo texto. Em segundo lugar essa receita feita com toucinho deve ficar algo bom demais rs rs Imagina, se com azeite já ta de comer tudo.
Nilson,
Obrigado pelo seu comentário.
Quanto às batatas vale a pena experimentar.
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