terça-feira, 8 de junho de 2010

O trono de Santo António

Na minha adolescência, antes de vir viver para Lisboa, ouvia falar das festas populares e a descrição encantava-me. Parecia-me muito divertido que bandos de jovens percorressem os bairros antigos, vestidos de cores garridas e se divertissem nos arraiais.

No primeiro ano que cheguei a Lisboa lembro-me de ter posto pelas costas um xaile branco com flores e de ter ido com um grupo de amigos percorrer as ruas.
Havia música e esplanadas em todos os larguinhos de Alfama, onde as pessoas se sentavam em bancos de madeira, à volta de mesas, para comer sardinhas e saladas com pimentos assados nos fogareiros. Bebia-se sangria, mas não me lembro de grandes bebedeiras como se vêem hoje.
Nos anos seguintes as ruas ficaram cada vez mais cheias e os grupos acotovelavam-se, perdidos rua-abaixo rua-acima à procura de qualquer coisa que não acontecia.
Foi uma grande decepção para mim e desisti dos festejos dos santos populares.


Mas a ideia do trono de Santo António, que me lembro de ver nalguns bairros ficou-me na memória. Antigamente os miúdos pediam “cinco-réisinhos” que depois passou a “um tostãozinho para o Santo António”. No filme Pátio das Cantigas, de 1942, ficou imortalizada esta tradição.
Com tronos mais ou menos elaborados, alguns apenas feitos com caixas de sapatos em cartão, os miúdos pediam dinheiro. Com o passar do tempo e o sentido prático que caracteriza esta sociedade, desde há algum tempo já surgem crianças a pedir o “tostãozinho”, sem sequer saberem que existem tronos.
Desde há vários anos que tinha vontade de fazer um trono de Santo António.
O Santo António já eu tinha, mas faltava-me o escadório que cheguei a encomendar a um marceneiro, para depois o pintar. Nunca foi feito.
O ano passado comprei uma presépio de Estremoz antigo . Este ano o escadório em barro serviu-me de base para o pequeno altar.

Ficou um misto de trono, nome porque é conhecido o altar em Lisboa e de cascata, designação pela qual o mesmo é designado no Porto, destinando-se aqui ao S. João.

Segundo Helder Pacheco (1) as cascatas do Porto, que surgiram no século XIX, sendo portanto mais recentes que o trono de Santo António, derivam dos presépios. Nelas a sagrada família e os reis magos desapareciam, ficando as restantes figuras e incluía-se o S. João.

A minha adaptação com escadório e a figura central do santo popular de Lisboa ficou muito satisfatória.
Faltam-me as velas nos candelabros e os pequenos vasos de manjerico que ainda não comprei.

Como vou estar ausente deixo-lhes já o meu Santo António, com votos de felizes Santos Populares.

(1)Anabela Couto e Hugo Manuel Correia, JPN – Jornalismo Porto Net, 23-6-2005

15 comentários:

Anónimo disse...

Está muito bonito o seu trono de Sto. António.E eu recordo as fogueiras que então se faziam à volta das quais rodavam rapazes e raparigas,as cantigas,os saltos.

Ana Marques Pereira disse...

Anónimo,
Obrigada. Estas recordações são sempre agradáveis.

Anónimo disse...

RECUO 50 ANOS E VEJO-ME NO PORTAL DO PRÉDIO NO BAIRRO DA GRAÇA, ONDE HABITAVA,A MONTAR O ALTAR DE STªANTÓNIO,UMA PEQUENA FIGURA DE BARRO,ARTE POPULAR QUE CUSTAVA DE 10 TOSTÕES NA CAPELISTA DO"GORDO"O TRONO ERA UMA CAIXA DE CARTÃO ADORNADA COM O NAPERON SURRUPIADO DA MESINHA DE CABEÇEIRA LÁ DE CASA E UMA JARRA ONDE PONTUAVAVAM VIÇOSAS E AMARELAS AZEDAS COLHIDAS POR ALI PERTO O "NEGÓCIO"RENDIA NAQUELE TEMPO TODA GENTE ANDAVA A PÉ TENDO QUE PASSAR JUNTO DA MIUDAGEM LÁ COMPRAVA UM S.JOÃO E UM S.PEDRO PARA QUE A COISA RENDE-SE ATÉ AO FIM DE JUNHO.

Anónimo disse...

ERAMOS MUITOS OS MIÚDOS,NO TOSTÃOZINHO PARA O STªANTÓNIO QUANDO HAVIA 5 TOSTÕES LÁ SE PARTIA NUMA CORRERIA AO LUGAR DA GRACINDA PARA OS TROCAR POR UM DELICIOSO SORVETE QUE SAIA FRESQUINHO DA CAIXA MÁGICA DO TRICICLO TAPADA COM UMA CAMPÂNULA DE METAL CROMADO.NO DIA 12 AO FIM DA TARDE OS VIZINHOS APARECIAM TODOS PARA VEREM EMBARCAR A MARCHA NUM VELHO AUTOCARRO DA CARRIS RUMO À AVENIDA, PARA O DESFILE,ALI ESTAVAM TODOS PARA VER OS FATOS DOS MARCHANTES E DESEJAR UM BOM DESEMPENHO.LISBOA CHEIRAVA A FESTA E A MANJERICO E OS MIÚDOS PODIAM BRINCAR ALEGREMENTE NAS RUAS SEM PERIGO,HÁ JANELA HAVIA SEMPRE UMA OU OUTRA VIZINHA PRONTA A PÔR NA ORDEM QULQUER DESATINO COM UM:"LOGO JÁ VOU DIZER AO TEU PAI"ERA FORMIDÁVEL O MÊS DE JUNHO!

Anónimo disse...

A lembrança dos tronos nesta epoca de crise pode ser a solução para a dita.Se as criancinhas se dessem ao trabalho, o que não acredito, de fazerem um trono, não pediriam um tostozinho.Pediriam o minimo de 5o centimentos ou ate de lE.O socretino inventava logo um imposto,obrigação de factura e recibo e a ASAE MULTARIA POR FALTA DE CASA DE BANHO. fRANCISCO

Ana Marques Pereira disse...

As recordações do anónimo que passou a sua infância na Graça transportam-nos a um Portugal já esquecido. Obrigado por as partilhar connosco.

Ana Marques Pereira disse...

Francisco,

Mas que espírito prático de empreendedorismo. Não era má ideia se fosse a solução. Pelo menos tinhamos muitos tronos para nos deleitarmos.

Carlos Caria disse...

Eu em vez de um trono, tenho por cá em casa muitos Santos Antónios de mais diversas maneiras e materiais.
A minha casa é um trono todo o ano e não dispenso o manjerico.

Ana Marques Pereira disse...

Carlos Caria,

Este seu comentário vem confirmar que Santo António é o santo mais apreciado em Portugal. Conheço várias pessoas que o coleccionam.

Carlos Caria disse...

Sem dúvida Ana, penso mesmo que será o Santo mais popular em todo o Mundo Católico, pois os países que tenho visitado é raro não haver uma igreja que não tenha um Santo António no seu interior mesmo nos antigos países de Leste Europeu.

Anónimo disse...

Mágnífica imagem e arranjo do seu "trono" ao nosso santo. Se lhe apetecer dê uma vista de olhos na minha coleção/blog onde po´derá ver muitas das mais variadas peças sobre o nosso Santo que tenho colecionado. Parabéns...e bem haja!!!

El Mano Del Tajo...

o meu blog...

muraldaspetas.blogspot.com

Ana Marques Pereira disse...

Mural das Petas,
Alegra-me que um especialista tenha gostado do meu trono.
Parabéns pela sua colecção. Vou dar o seu blog a uma pessoa que também faz colecção de Santos Antónios. Confirma o que eu disse de ser um santo com muitos admiradores.
Cumprimentos

El Mano Del Tajo disse...

Olá

Ainda bem que gostou da minha colecção. E quem me dera ser especialista, só mesmo coleciono porque além do meu 1º nome ser António tenho grande devoção pelo santo e esta é a minha forma de o mostrar. Preservando a sua memória para o futuro. E achei a sua ideia muito original de combinar o trono do presépio estremocense com o "presépio" lisboeta...
Só gostava era de arranjar os adereços do altar há muito tempo que ando a ver se os arranjo em feiras por este país(castiçais, custódia,etc)são em chumbo não é? mas não tenho tido sucesso...

Cump.

El Mano del Tajo

Ana Marques Pereira disse...

El Mano del Tajo,
Se encontrar alguns desses acessórios em chumbo ou outro material contacto-o.
Entretanto dei o seu blog a uma jornalista que quer fazer uma reportagem sobre tronos de Santo António.
Cumprimentos

El Mano Del Tajo disse...

Olá

Já fui contactado pela jornalista, e já lhe dei algumas informações sobre o que poderá precisar para o seu trabalho. E agradeço-lhe então se porventura vier a encontrar os tais adereços, pois efectivamente ao tempo que ando a ver se os localizo, mas não tenho tido sorte...

Obrigado

El Mano del Tajo