segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Os livros do Dr. Adrián Vander

Ao folhear o livro Regimenes Agradables para Sanos Y Enfermos, não pude deixar de me lembrar que, em muitas das dedicatórias para pessoas saudáveis que faço no meu livro Receitas e Truques para Doentes Oncológicos, ressalvo que as mesmas também são boas para pessoas sãs.
O livro, da autoria de Dr. Vander e data de 1955 (5ª edição), despertou-me a curiosidade pelo autor e a sua obra.
O seu verdadeiro nome era Adrian Van Der Put e era de nacionalidade Holandesa, onde nasceu em 1820. Terá sido director do Sanatório Kuhnne, em Leipzig mas, provavelmente por não ser médico, passou para Espanha em 1912, onde adaptou um novo nome mais fácil. Instalou o seu consultório em Barcelona e começou a dar consultas de naturopatia, que publicitava na revista la Salud, de que era editor. 
Embora inicialmente lhe tenha sido concedida licença esta foi-lhe retirada e passou a desenvolver a sua actividade literária publicando mais de 50 livros, todos tendo como tema a Medicina Natural ou Naturismo. Hoje é considerado o pai da naturopatia em Espanha. 
Os seus livros, de que não vou mencionar os nomes (por razões evidentes), apresentavam características ideológicas e gráficas semelhantes ao apresentado.
 
As imagens são aparentemente desenhadas pelo próprio autor, uma vez que apresentam num dos cantos «DR V» e são todas muito interessantes. Ilustram de forma encantadora e muito colorida o que devia ser uma alimentação correcta. Nesse sentido apresenta os principais produtos alimentares e os pratos bem decorados de forma a serem apetitosos. 
Nas suas obras o autor fazia a apologia da «Medicina Natural» e dentro desta destacava os regimes de alimentação lacto-ovo-vegetariano, que considerava mais adequado para pessoas saudáveis e para algumas doenças, e os regimes vegetariano puro e crudíveros (purificador e reconstituinte), mais adaptados aos doentes. 
Os seu livros tiveram um imenso sucesso, o que não admira porque ao observarmos as imagens até nos esquecemos de que se trata de pratos exclusivamente vegetarianos.
Os seus conceitos são ainda hoje actuais, e fazem-me lembrar uma frase do meu professor de desenho, o arquitecto Calais (um homem avançado para a época), que dizia: «Não há nada de novo à superfície da Terra». 

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

A Fábrica de Refrigerantes Delta

 
Uma aspecto das secções de rotulagem e lavagem das garrafas
A fábrica de refrigerantes Delta foi fundada em 1945, em Castelo Branco por Rogério de Almeida Martins Ruivo, que funcionou como director técnico e por seu irmão Raúl de Almeida Martins Ruivo que tinha a seu cargo a parte comercial.
 
O laboratório da fábrica
A empresa designada Martins Ruivo, Lda, tinha então instalações modelares com as máquinas de produção situadas no rés-do-chão enquanto que no 1º andar se situavam os laboratórios. As secções de fabrico e de vasilhame estavam ligadas por um higiénico sistema de tubagens. Tinha também secções de lavagem de garrafas, enchimento e rotulagem independentes e separadas por vidraças.
Na fábrica trabalhavam algumas dezenas de funcionários e a produção diária de refrigerantes era de 6 mil garrafas.

Casa das lavagens das garrafas
Dos refrigerantes eram sobretudo apreciadas as laranjadas, mas a fábrica era também conhecida pela produção de xaropes de limão, groselha e outros frutos.
Em 1947 a fábrica estava no auge e começavam a ser conhecidos em vários pontos do país tendo iniciado a distribuição em garrafões de 5 e 10 litros para revendedores, que era de grande utilidade porque então este tipo de bebidas era vendido em tabernas e cafés.

Em reportagem feita para a revista Viagem na Primavera de 1947 a empresa preparava-se para a produção de licores de todas as qualidades para o que dispunha já de pessoal especializado. Na notícia era referido que esta era a única indústria de xaropes da Beira Baixa. Apenas em 1950 foi pedido o registo do nome «Fábrica de Refrigerantes Delta» (concedido a 18/2/1950).
 
Casa das máquinas
Não foi esta contudo a primeira fábrica de refrigerantes local. O meu Tio António, de 87 anos de idade e uma memória prodigiosa, confirmou-me a existência desta fábrica no Largo da Srª da Piedade. 
Garrafa e fotografia de Alberto Santos Alves
em Frascofilia no Portal dos Clássicos
Contou-me que antes tinha existido uma outra fábrica chamada «Castraleuca» que produzia refrigerantes, pirolitos, gasosas e laranjadas e que era pertença de David Benfica. Ficava ao fundo da Rua de Santiago (actual Praça da rainha D. Leonor) e passou depois para a Alameda do Cansado onde existia um poço com água de muito boa qualidade, pertença da Câmara, que a fornecia contra pagamento. 

No Anuário Comercial de Portugal de 1967 aparecem ainda as duas fábricas de refrigerantes: a Castraleuca Lda, na rua Guilherme de Barros ao Cansado e a Delta no Largo da Senhora da Piedade. Contudo no Anuário de 1973 já só vem indicada a Castraleuca.

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Museu Virtual: Lancheira escolar

Nome do Objecto: Lancheira escolar.
  
Descrição: Caixa rectangular com tampa e duas asas. Litografada a cores, apresenta nas faces laterais peixes e outros elementos marinhos. Na tampa surge o desenho de um menino vestido de pescador com um varão sobre os ombros com duas cestas para peixe, na praia, à beira do mar.
  
Material: Folha-de-flandres litografada.
  
Época: 1940-1960
  
Marcas: Não tem. A representação da tampa está assinada «J Almeida» e faz lembrar os desenhos de Laura Costa.
  
Origem: Adquirida no Porto em 2013.
  
Grupo a que pertence: Equipamento culinário.


Função Geral: Recipiente para transportar alimentos.
 Função Específica: Usada pelas crianças para levar o almoço para a escola.

 Nº inventário: 1147.

Objectos semelhantes: Não classificados.

NOTA:
Encontram-se em exposição vários tipos de lancheiras da colecção de Maria Proença e outros, no Centro de Artes Culinárias, no Campo de Santa Clara em Lisboa. Intitulada Cozinhas nómadas mostra vários tipos de equipamento utilizados em refeições fora de casa e onde se podem ver lancheiras de trabalho, militares e escolares. Ainda podem ir ver.


sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Margarina Chefe: «Comer bem...digerir melhor»

Seleccionei este folheto, distribuído em 1960, pelo seu belo aspecto gráfico. Foi feito na empresa de publicidade Ciesa, que pertencia à Sociedade Nacional de Sabões, de cujo grupo fazia também parte a Fábrica Nacional de Margarinas. Não tem qualquer assinatura e foi impresso na Lito Maia.
Na capa um atraente prato de lombo de carne assada, ladeado por vários legumes aprumados, confirmava o título.
Lá dentro uma dona de casa de olhos orientais e sorriso enigmático apresentava-nos a Margarina Chefe: «Nova Inteiramente Nova».
A segunda folha, com um desdobrável recortado ampliava a cena de frutos tropicais (Coco, amendoim e palma) de grande beleza onde era realçada a presença na margarina de vitaminas, calorias e proteínas. 
Para terminar na contracapa apresentavam-se 3 receitas de pratos feitos com margarina. 

Os meus comentários ficariam por aqui, salientando as características da publicidade alimentar da época, se não fosse um pormenor original. 
Na face posterior da extensão recortada era inserida uma informação científica. Referiam-se os estudos dos Dr. Bun e Barnes (1) que haviam estabelecido uma relação entre a alimentação a a arterioesclerose e em especial o papel desempenhado pelas gorduras no seu desenvolvimento.
Mencionavam-se as provas de que a gordura de origem animal (uma referência subtil à banha usada em Portugal) levavam ao desenvolvimento da arteriosclerose , enquanto as de origem vegetal tinham acção preventiva.
Confesso que perdi bastante tempo à procura destes estudos (inclusive na Pubmed), mas não os consegui encontrar. Mas encontrei outros idênticos. Pensava-se então que bastava reduzir as gorduras para diminuir a doença cardíaca, mas o tempo veio mostrar que o importante era consumir dietas saudáveis com gorduras “boas” e não era a quantidade que contava. 

Os estudos americanos mostraram que na década de 1960 cerca de 45% das calorias alimentares provinham das gorduras e existiam cerca de 13% de obesos adultos(2). Presentemente o consumo de calorias baixou para 33% e existem 34% de adultos obesos(3).

Não vou falar nas gorduras boas (não saturadas) e más (saturadas) mas nas péssimas como as trans. Estas são obtidas por aquecimento dos óleos vegetais em presença do hidrogénio, num processo chamado hidrogenização, que pode ser parcial ou total. Este processo do ponto de vista comercial tem a vantagem de tornar os óleos vegetais mais estáveis e mais facilmente transportáveis porque passam ao estado sólido.
Esta descoberta foi recebida de braços abertos pela indústria alimentar, em especial pelas cadeias de fast food, mas também pelos produtores de margarina. As margarinas sólidas, mesmo feitas com óleos vegetais não saturados, são menos saudáveis do que a manteiga, porque contêm ácidos gordos trans. Nos anos 60 não se sabia isso, mas hoje há que estar atento aos rótulos de composição dos alimentos e, se lerem que têm gorduras trans, não comprem.
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 (1) Poderá ser o Dr. Robert W. Barnes, que foi médico chefe do serviço de Cirurgia Vascular entre 1978-1981 no VA Medical Center, Richmond ?.
(2) USDA Center for Nutrition Policy and Promotion.Nutrition Insights: Insight 5: Is Total Fat Consumption Really Decreasing? 1998.
(3) Flegal K, Carroll M, Kuczmarski R, Johnson C. Overweight and obesity in the United States: prevalence and trends, 1960-1994, Int J Obes Relat Metab Disord. 1998;22:39-47.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Objecto Mistério Nº 38 Resposta: Paliteiros

 
Este desafio não era fácil. Eu própria estive enganada durante anos quanto à função deste objecto. Comprei duas jarrinhas destas há mais de 30 anos e pensava que se destinavam a colocar flores no recipiente posterior. Quando fiz um trono de Santo António fui procurá-las mas uma já tinha desaparecido, levada por alguém que com ela se encantou. 
Há uns meses atrás encontrei uma outra igual no Porto e o par ficou completo.
Confirmou-me a experiente vendedora que se destinavam a palitos. Fazia sentido. O tamanho é perfeito para essa função e vistas de frente estes não são visíveis.

Tinham assim função utilitária e decorativa sobre a mesa, numa época em que a presença das flores sobre esta era importante. 
Devem datar do final do século XIX ou início do século XX e fazem lembrar as mesas que vimos representadas nas gravuras dos livros de Mrs Beeton. A presença destes puritanos paliteiros integrava-se perfeitamente na profusão floral que cobria o centro.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

O menino de pão de ló

Os livros com partes móveis existem há centenas de anos. Um dos primeiros exemplos surgiu no século XIII tendo sido concebido por Ramon Llull, de Maiorca (1232-1316), que escreveu livros de alquimia e botânica. Foi o criador de um disco designado volvelle ou círculo Lulliano, que consistia em dois ou mais círculos de papel com com letras ou símbolos que rodavam e que tantas aplicações teve no futuro (ainda me lembro de usar em Obstetrícia uns discos para calcular a data de nascimento das crianças baseados nesta técnica).
No século XVIII Robert Sayes produziu livros de «metamorfoses», em 1765, também chamados «turn-up» ou «harlequinades» que eram compostos por folhas impressas e dobradas. Quando desdobradas noutras posições apareciam outras imagens que contavam uma diferente história.
Entre 1810 e 1816 uma empresa inglesa dedicada a produtos infantis, a firma S. & J. Fuller, produziu um série de livros que tinham bonecas de papel com cabeças móveis e fatos variados para as vestir. Não tinham histórias e eram considerados brinquedos. Os livros móveis para crianças surgiram apenas em 1860 e foram publicados por Dean and Son.
Em 1890 Ernest Nipers concebeu uns livros em que as figuras eram recortadas e surgiam automaticamente quando se abria o livro. Vários exemplos se seguiram até chegarmos ao trabalho de Julian Wehr que publicou o primeiro livro móvel designado «As excitantes aventuras de Finnie e Fiddler». 
Wehr registou a patente do seu dispositivo, muito simples, que consiste numa única paleta, na parte inferior do livro, que mexia para a frente e para trás e que fazia mexer mais do que um mecanismo e fez com esta técnica mais de trinta livros. Estava-se na época que antecedeu os livros pop up, que desabrochou nos anos 60 e de que já falámos anteriormente.
Este livro aqui apresentado foi publicado nos Estados Unidos em 1943 com o título «The Gingerbread Boy», o que revelava as origens alemãs do escritor norte-americano. Traduzido para português como «O menino de Pão de Ló» o que fazia todo o sentido numa época em que os portugueses não sabiam sequer o que era o gengibre e as bolachas de gengibre, de influência inglesa, era pouco conhecidas (exceptua-se a sua produção na Madeira pela Fábrica de Santo António, como produto localizado) .
A história, os desenhos e a animação saíram todos da mesma pena. A narrativa é um bocado sinistra, mas com a insensibilidade que caracteriza as crianças, deve fazer sentido. Conta a história de um casal idoso muito feliz em tudo excepto no facto de não terem um filho. Um dia a velhinha resolve fazer um bolo com o feitio de um menino para viver com eles. No forno o menino de bolo toma vida e sai a correr recusando-se a viver com o casal. Seguem-se as desventuras que resultam do encontro do menino bolo com uns lavradores, com uma vaca, um porco e uma gata selvagem, todos procurando-o comer. Desanimado o menino volta a casa do casal. Muito contente a velhinha abraçou-o «mas, de repente,... zás. O menino de pão de ló partiu-se em dois pedaços iguais». O que mostrava que os meninos de pão de ló serviam para serem comidos e «o velhinho e a velhinha acabaram por comer inteirinho este menino de pão de ló».
Acaba assim a história de um forma que nos deixa de olhos abertos, sobretudo quando estamos à espera de um final feliz. Para além das ilustrações no meio do texto o livro tem 5 folhas com mecanismos móveis por meio de um paleta, como era hábito do autor, e que delicia as crianças e alguns adultos, como é o meu caso.