segunda-feira, 27 de julho de 2015

O Hotel Bragança em Cascais

Em 15 de maio de 1895 o novo proprietário, Victor Lestage, anunciava a mudança de mãos de um dos principais hotéis de Cascais.
Na segunda metade do século XIX surgiram nesta vila alguns hotéis como o Hotel União, que pertencia a Bernardo Soutelo e o Hotel Lisbonense também conhecido por Hotel Neto, do nome do seu proprietário. No final do século, em 1893, existiam o Lisbonense, o Globo e o Central.
No Anuário Comercial de 1894 surge referido o Hotel Bragança pela primeira vez. Na realidade não era um novo hotel. Tratava-se do Hotel Central que pertenceu a Felice Petracchi que o vendeu a Victor Lestage, que então lhe terá alterado o nome.
Cascais no final do Século XIX
Neste papel de propaganda, o novo proprietário informava que o hotel estava muito bem localizado, embora não mencionasse o local, mas dizia ter magníficos quartos com vista para a baía. No que se refere à alimentação não deixou o novo dono cair a boa fama que Petracchi tinha dado ao restaurante do Hotel, havendo referências que continuavam a ser bem servidos os fregueses.
As refeições podiam ser servidas em reservados, para quem desejasse, na sala de jantar ou mesmo no exterior no jardim. No restaurante servia-se «à la carte», isto é, por escolha da lista, mas tinha também «meza redonda». A mesa redonda era um tipo de serviço com hora e prato fixo. À hora determinada, no caso deste restaurante às 6 horas da tarde, era servido um prato já confeccionado, igual para todos. A expressão mesa redonda significava que as pessoas se sentavam todas numa mesma mesa, à medida que iam chegando, mas podia não ser assim. O preço era fixo e no restaurante do Hotel Bragança era de 600 réis ao almoço, incluindo meia garrafa de vinho, e de 800 réis ao jantar.
Em 1907, no «Manual do Viajante em Portugal», Cascais era referida como uma pequena vila cuja importância lhe advinha de ser o balneário marítimo da sociedade elegante de Lisboa e nele vinha mencionado o Hotel Bragança, seguido do Central e do Globo, e confirmando que ainda existia.

Não me foi possível encontrar alguma foto do hotel para ilustrar o texto, mas voltarei ao tema para explicar porque razão se deu esta transferência de propriedade.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

The ghosts of my friends (Os fantasmas dos meus amigos)

Este pequeno livro de folhas virgens destinava-se a receber as assinaturas dos amigos do seu dono. Mas era mais do que um livro de autógrafos. O seu interesse reside no facto da assinatura, escrita com tinta que demorava a secar, ser feita no meio de uma folha, que era depois dobrada. Criava-se assim uma imagem dupla, em espelho, com um misto de assinatura e de uma mancha que representava o espírito, ou alma, da pessoa.
O livro foi concebido por Cecil Henland, uma escritora de livros infantis, que foi também criadora de um sistema de ensino em Inglaterra, onde o livro foi publicado.  Existe contudo uma versão idêntica publicada nos Estados Unidos.
No século XIX divulgou-se um jogo chamado Klecksographie (de «Klecks» que significa mancha de tinta) em que os intervenientes desenvolviam pequenos poemas a partir de manchas abstractas de tinta.
Foi com base nestas interpretações que o psiquiatra suíço Hermann Rorschach (1884-1922) desenvolveu o teste de Rorschach, um teste do borrão de tinta, que se destinava a servir de técnica de avaliação psicológica, ideia que defendeu em tese em 1921. 
Embora no início as imagens fossem em maior número acabou por se desenvolver com dez cartões com manchas de tinta simétricas, que os doentes viam e interpretavam. Mais difícil era harmonizar o resultado das respostas.
Nada que preocupasse os possuidores do livrinho «Ghosts of my friends» mais preocupados em coligir as assinaturas de amigos e pessoas importantes e no aspecto estético da imagem do que nalguma forma de significância. A ideia difundiu-se por vários países e este foi oferecido a um António seguramente por uma inglesa a viver em Portugal chamada Edith Robinson, em 1907. 

sábado, 18 de julho de 2015

Objecto Mistério Nº 46. Resposta: Apanha gotas para bule

Imagem tirada da internet (Pinterest)
A resposta parecia-me fácil mas o facto de ninguém terá certado mostra que este utensílio é pouco conhecido. É verdade que na imagem falta a pequena esponja que o devia acompanhar, ausente não porque eu tenha querido aumentar o grau de dificuldade, mas porque a sua fragilidade as faz desaparecer. No único exemplar em que esta ainda persiste tenho que lhe pegar com cuidado porque se desfaz.
Na realidade este tipo de objectos dão resposta a uma dificuldade constante que consiste em evitar que após servir o chá uma gota desta bebida caia sobre a toalha. Este fenómeno designado «teapot effect» foi inicialmente atribuído a tensão superficial mas experiências feitas em 1956 por Markus Reiner mostraram que era outra a razão. Uma delas devia-se à velocidade do líquido no bico e que quando mais lenta esta era maior a possibilidade deste pingar.
A este assunto voltou Joseph Keller, professor de Matemática e Engenharia Mecânica da Universidade de Stanford, vencedor do prémio Nobel, que atribuiu a causa a uma combinação do princípio de Bernoulli com o efeito da pressão de ar que empurra a água para dentro do bico do bule.
Em 2009 foram os cientistas franceses que atribuíram outra causa: o efeito da humidificação (wettability), isto é, o modo como um líquido adere a uma superfície sólida. O uso de materiais hidrofóbicos, baseados no efeito lotus (em que a folha da flor de lotus repele a água da sua superfície) tornou-se conhecido com o aparecimento de roupa em que os líquidos escorregam e não se impregnam.
Pois este mesmo efeito pode vir a ser usado para cobrir o interior dos bicos dos bules com um material superhidrofóbico, dividindo a corrente do chá em gotas e impedindo estes de pingarem.

Agora pergunto eu como apreciadora de chá: será que esta alteração da tensão superficial não vai alterar o gosto do chá?
Não será mais fácil usar um objecto deste tipo, caso este seja um problema para o apreciador desta bebida?
É que além disso permite escolher um dos belos modelos de que apresento alguns exemplos e que nos permitem concluir que os pássaros e as borboletas são os mais populares. Mas no campo dos apanha gotas figurativos há um grande número de interessantes modelos,  de que ficam algumas amostras.
Outra forma de segurar os apanha gotas. Foto tirada da internet

terça-feira, 14 de julho de 2015

Objecto Mistério Nº 46


Tem pequenas dimensões (cerca de 2 cm) este anão de porcelana, mas foi já muito útil. 

Ainda hoje podia ser usado, mas a vida está muito simplificada e os rituais são menores.

Qual era a sua utilidade ?  Como se designa?

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Modo Simples de Preparar Pratos de Comida Caseira

Este pequeno e singelo (que palavra tão adequada) livro foi escrito pelo Padre António Maia, missionário em Angola, e publicado pela primeira vez em 1960.
Este missionário angolano nasceu em Ovar em 1905 e estudou nos seminários da Missões de Cucujães no Porto e dos Olivais de Lisboa. A escrita e publicação de livros não era um campo novo. Anteriormente havia já publicado 14 livros religiosos.
Chegou a Ambriz em 1935 já como subdiácono para professor auxiliar da Missões. Celebrou o 25º ano da sua chegada a Luanda com a publicação deste livrinho. 
Padre António Maia. Foto tirada do Jornal João Semana
O autor explica que quando chegou a Luanda começou a tomar rápidas notas de culinária europeia e angolana, que acabou por publicar com a intenção de ser útil nas suas viagens de evangelização através do mato e sertão africanos.
O livro com 83 receitas esgotou-se rapidamente e na 4ª edição já haviam sido feitos 10.000 exemplares. Esta que eu tenho é a 5ª edição, publicada em 1961, de 2500 exemplares. Isto é, ao fim de um ano, haviam sido distribuídos, presumo, 12.500 livros, o que é verdadeiramente espantoso.
Os pratos são bastante básicos, como fazia sentido, com um predomínio de pratos de sopas (ou não fosse português), de pratos de arroz e de feijão, mas também pratos com carne e peixe. Mas também sobremesas como arroz-doce, cremes, aletria, merengues, doces de coco, de amendoim, de caju, de banana, etc.
Os pratos angolanos são vários e mostram a sua integração local, mas também o desejo de ensinar coisas básicas como o «Modo de fazer farinha de mandioca», de fazer «fuba de bombó», «Como cozinhar funji ou pirão», a par de receitas que remontavam à sua juventude como o modo de fazer broa de milho, ou, a partir da 4ª edição, uma receita nova de Ovar, a sua terra natal, ou o modo de fazer marmelada, entre outras.
No final no «Apêndices» há ainda lugar para um pequeno glossário de «Conhecimentos úteis e vocabulário», o «Modo de fazer hóstias para o Culto Divino», «Modo de purificar óleo de palma», «Utensílios de cozinha», etc.
Foto tirada do Jornal João Semana
O Padre António da Silva Maia deve ter sido um bom evangelizador da doutrina cristã nas terras de Angola, mas foi seguramente um bom professor de coisas práticas que ajudaram a mudar a vida das pessoas. O seu pequeno livro é uma doçura pela sua simplicidade e mostra-nos como coisas simples podem fazer a diferença. Com ele alguém ficou a saber mais, nem que seja, aquilo que nos parece tão elementar como «Preparar leite condensado ou em pó», produtos então desconhecidos.

sábado, 4 de julho de 2015

Festival do Silêncio em Lisboa

Vai já na 5ª edição e eu não tinha dado por ele. Vai repetir-se entre os dias 2 e 5 de Julho nas Ruas da Boavista / Rua de S. Paulo / Cais do Sodré.
O programa é vasto e não vou falar nele. Quero no entanto mostrar-lhes a forma de participação dos habitantes da zona.
Trata-se da representação de palavras escritas em painéis de grande formato, formando ou não frases. Transmitem ideias sobre a cidade de Lisboa e a sua vivência.
Mostram o gosto dos cidadãos pelo local que habitam mas também preocupações. Não é por acaso que a palavra silêncio aparece várias vezes. Não se deve ao nome da iniciativa mas às preocupações dos cidadãos com o seu sossego, numa zona invadida por visitantes de outros locais, que não respeitam o silêncio e tornam infernal a vida dos locais.
No fundo queremos dizer que, apesar de tudo, os que aqui vivem têm forçosamente que ser mais importantes que os visitantes ocasionais. E que a cidade antiga tem que continuar a ser habitável e não ser transformada numa Disneylândia como está a acontecer à Baixa Pombalina.