sábado, 30 de maio de 2015

Primícias sobre a mesa ou o mistério do alperce

As ditas primícias, neste caso alperces
PRIMÍCIAS – Os primeiros frutos ou legumes que são colhidos.
ALPERCE – Fruto do damasqueiro. Um mistério, porque não existe «alperceiro» para dar alperces e a etimologia de damasco é ainda mais difícil de explicar do que a de alperce. José Pedro Machado cita uma fonte (Plínio) que diz que este nome se deve «porventura porque os primeiros vieram à Europa da cidade de Damasco».
O «albaricoque romano» no Lindley's Pomology Magazine, 1828, Museu de História Natural de Londres

Quanto ao alperce é classificado em Botânica como Prunus armeniaca L. por se pensar que era natural da Arménia de onde foi trazido pelos romanos para o sul da Europa, em 70-60 aC através da Grécia e da Itália, razão porque no século XIX também foi designado «albaricoque romano». Contudo o seu centro de diversidade foi no nordeste da China, há milhares de anos, de onde se espalhou por toda a Ásia Central.
O alperce no Damasqueiro. Foto de Afonso Oliveira
Os romanos chamaram primeiramente à fruta malum (ou Prunum) Armeniacum "maçã (ou ameixa) arménica" e depois praecoquum malum «maçã que amadurece cedo», comparando-a com os pêssegos, com que eram aparentados. Os gregos pronunciaram a palavra como praikókon, mas em Bizâncio ela mudou para beríkokkon. Na língua árabe a palavra mudou para al-burqoq. Foi dessa origem que veio o nosso albricoque e o espanhol albaricoque.

Mas não ficam por aqui as designações nacionais deste fruto, em especial se incluirmos os regionalismos. É também chamado: damasco, alcácaro, alcocore, abricote (do fr. abricot), alperche, albricoque e aposto que ainda existem mais nomes que eu desconheço. Fica aqui o desafio para aumentarem esta lista, caso conheçam outras designações.

PS. Este poste e as fotos resultam da oferta de um ramo do dito fruto, fotografado na árvore pelo amigo que me o ofereceu. 

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Reviver o passado … em Lisboa

A minha amiga Isabel Kiki ofereceu-me uma foto de família que mostra um almoço de aniversário que teve lugar numa casa da Avenida Defensores de Chaves, em 1943.
Festejava-se o aniversário de uma pessoa amiga e, sobre a mesa, pode ver-se um serviço de pratos que conseguimos identificar. Trata-se de um modelo da Fábrica Sacavém, com flores azuis, de que desconheço a designação.
Recreamos o momento ao colocarmos o prato de sopa sobre os dois pratos que seriam para peixe e carne, respectivamente com a visão que cada um dos convivas teria. Um exercício de estilo. Só fica a faltar a ementa.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Exposição «Varinas de Lisboa. Memórias da Cidade»

Milly Possoz
Termina já no dia 24 de Maio a exposição sobre esta figura feminina tão representativa da cidade de Lisboa e que está presente no Museu da Cidade, agora designado Museu de Lisboa, no Palácio Pimenta.
Tapeçaria com desenho de Mário Dionísio
Chegadas à capital no final do século XIX percorriam as ruas da velha Lisboa vendendo o peixe que descarregavam das traineiras do Tejo.
Os seus pregões e a sua imagem permanecem na memória de quem as conheceu.
Desenhos de oleados de canastras
Pessoalmente recordo a admiração pelo equilíbrio da grande canastra sobre a cabeça e os oleados de plástico amarelo pintados, de formas variadas, que forravam o interior da canastra. Serviam para manter o peixe fresco e protegiam as varinas da água, ao mesmo tempo que as diferenciavam e mostravam o seu gosto estético.
A exposição, que foi também uma homenagem às varinas ainda vivas, é extremamente diversificada e interessante.
Ficam algumas imagens e o aviso de que se forem rápidos ainda podem visitar a exposição que termina já no próximo domingo. Não percam!  

segunda-feira, 18 de maio de 2015

A Padaria Ingleza representante do Chá Horniman's

Regresso ao tema da Padaria Ingleza, de que já falei anteriormente, a propósito do chá Horniman’s. Por coincidência, na minha última ida ao Porto, onde faço sempre um périplo por alfarrabistas e velharias já meus conhecidos, consegui encontrar um «Guia Ilustrada de Lisboa», com um anúncio da Padaria Ingleza e uma caixa de chá da Horniman’s.
Sendo ambas da mesma época, isto é, dos finais do século XIX, é forçoso que as relacione.
O chá Horniman’s tem uma história muito educativa e o comércio original deste famoso produto foi iniciado por um comerciante inglês John Horniman (1803- 1893) que fundou a empresa com o seu nome, em Newport na ilha de Wight, em 1826.
John e o seu irmão foram educados numa escola Quaker e logo após o seu casamento aderiu a esta forma de protestantismo, o que é relevante nesta história, por justificar o seu envolvimento social como benemérito e a sua honradez comercial que lhe granjearam um bom nome.
Imagem tirada da internet
Na altura em que John fundou a “Horniman's Tea Company” o chá era vendido avulso e frequentemente adulterado para proveito dos seus vendedores. Para provar a sua honestidade Horniman começou a vender o seu chá selado, embalado por processos mecânicos, o que baixou o preço da produção e melhorou a qualidade do produto que passou a ser vendido em pacotes e caixas que impediam a manipulação posterior do produto.
Imagem tirada da internet
Contudo um grande incremento de vendas deu-se quando começaram a surgir na revista médica «The Lancet» uma série de artigos sobre adulterações de alimentos. Publicados entre 1851 e 1854 foram estudados muitos dos alimentos consumidos na época e entre eles o chá. E os ingleses descobriram, aterrorizados que até o seu sagrado chá era manipulado, sendo-lhe adicionado vários outros produtos para lhes alterar a cor e aumentar o lucro. Com surpresa constataram que dos chás analisados, apenas o Horniman’s estava imaculado. É por essa razão que nas embalagens e na publicidade ao produto aparece a expressão «pure tea».
As vendas não pararam de crescer e a empresa mudou-se para Londres, logo em 1851, para junto do porto e começaram a exportar. No final do século eram já a maior empresa de comércio de chá mundial.
O prestígio do chá Horniman's (imagem tirada da internet)
É aqui que entra John Broomfield que juntamente com a sua mulher Ann, que depois lhe seguiu no negócio, se tornaram os primeiros representantes e vendedores do chá Horniman’s em Lisboa.
No século XIX os portugueses ainda bebiam preferentemente chá verde, mas rapidamente, por influência do comércio inglês iriam passar para o chá preto. Na Padaria Ingleza era vendido o chá preto e verde da então designada Horniman &  Co. 
Após o afastamento voluntário de John que entregou o negócio aos seus filhos William Henry (1831-1900) e Frederick John (1835-1906), passando a firma a ser identificada pelas iniciais “'W.H. & F.J. Horniman” que são as que surgem na tampa desta caixa, o que a data em 1889, aproximadamente.
 Ignoro se a lata foi feita em Inglaterra e destinada a exportação, uma vez que em duas das faces surgem rótulos em francês e em português e não está identificada. Nessa segunda hipótese atrevo-me a pensar que poderia ter sido feita na latoaria da Viúva Ferrão, à época vizinha de rua da Padaria Ingleza original.
Marcador de livros mais tardio com publicidade ao Chá Horniman's

sexta-feira, 15 de maio de 2015

quinta-feira, 14 de maio de 2015

5ª feira de espiga: a passagem do testemunho

Para os mais distraídos fica a chamada de atenção: hoje é  5ª feira de espiga. 
Compra-se a nova espiga (infelizmente já não dá para ir apanhar) e deita-se fora a do ano anterior.
O ramo de espiga de 2014
Cumpre-se a tradição.

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Sabão Carbol: o melhor aliado dos colonos em África

 A imagem da enfermeira na embalagem não deixa dúvidas. Mas a legendagem da caixa esclarece que o uso deste sabão é: «essencial para uso em hospitais, escolas, hotéis, casas de saúde, etc.». E acrescenta: «O uso diário deste sabão é o mais forte preventivo contra as doenças.  
É por isso que se recomenda para «usos domésticos, lavagem de roupas, flanelas, cobertores, sedas, soalhos, mobílias, etc.».

«O sabão carbol é a garantia da saúde», pode ainda ler-se noutro lado da caixa, onde também se explica que a salvaguarda da saúde deve-se ao facto de lavar e desinfectar. A  conclusão mais interessante de toda esta informação é a de que este é «o maior aliado dos colonos em África».
Produzido em Moçambique, em época que desconheço pela «Trans-África (Industrial), Lda.», com sede em Lourenço Marques existia ainda em 1974 e era seu Director Manuel Curto e Silva. Estava nessa altura ligada à «The Mozambique Soap & Oil, Co», uma empresa registada na África do Sul já em 1901.
Encontrei um outro sabão no Brasil com Carbol, em 1911, que mostra que devia ser moda nessa época o seu uso. De que falamos? O carbol é um ácido cristalino branco, solúvel, um produto tóxico derivado do benzeno. Tem uso industrial como desinfectante e anti-séptico, mas se for ingerido é venenoso.
Quarto privado do Hospital de Lourenço Marques
Claro que não há o risco de hoje alguém se cruzar com este sabão. Esta embalagem que incluía três sabões duplos embrulhados num papel explicativo, deve ser extremamente rara. Veio parar a Portugal, talvez trazido no período da descolonização. Mas a sua produção deve ser muito anterior.  
Vêm-me à memória imagens de um Moçambique antigo como as que podemos ver nos «Albúns Fotográficos e Descritivos» de Moçambique de 1929, de que deixo algumas estampas pontuadas de brancura  que nos faz perceber como um produto destes fazia todo o sentido.

sábado, 2 de maio de 2015

Uma lancheira de design

 Este objecto de design designa-se «Lunch Book» que se traduz por lancheira, uma instituição nos Estados Unidos, agora cada vez mais frequente em Portugal, trazendo de volta os anos do Estado Novo.
Na realidade «lancheira», que é sinónimo de «merendeira», aplica-se aos cestinhos ou caixas destinadas a levar a comida. Os americanos usavam caixas de lata, com uma pega, com desenhos de cores, sobretudo destinadas às crianças. Na minha infância lembro-me de um cestinho onde eu levava para a escola o lanche, uma vez que, como o nome indica, a isso se destinavam.

Hoje é usada como sinónimo de marmita, que na altura se destinava aos adultos para levarem o almoço para o trabalho. Com a nossa imprecisão de linguagem as duas palavras tornaram-se sinónimos, embora o não sejam. Quando muito a marmita vai dentro da lancheira, o que é verdadeiro sobretudo se pensarmos que hoje as lancheiras se transformaram em mochilas ou outros sacos do género.


A grande diferença no que respeita às marmitas está contudo nos modelos. Antigamente usavam-se caixas de alumínio ou esmalte, empilhadas e fixas por molas, enquanto agora são em plástico, coloridas e mais atractivas. E ganharam estatuto. As pessoas já não se importam de comer da marmita.

Voltemos à razão deste poste: a lancheira que é da autoria de Alessandro Garlandini e Sebastiano Ercoli e que ganhou o 1º prémio na competição para o tema na  Expo Milan 2015.
«Lunch Book» é um livro de receitas feito com pratos de papel que pode ser usado para comer durante a exposição. Cada prato, feito em papel 100% reciclável,  mostra uma receita de um diferente país.

A Expo Milano 2015 é uma exposição internacional que inaugura hoje (dia 1 de Maio) e se extende até 31 de Outubro. Os seus organizadores esperam que seja o maior evento sobre alimentação já realizado. Com uma área expositiva enorme , sob o tema Feeding the Planet, Energy for Life, serão mostrados os avanços tecnológicos e as preocupações a discutir vão no sentido de garantir alimentos seguros, suficientes para a população e que respeitem o planeta. Que mais se pode pedir?

Estarão presentes 140 países e espero que Portugal seja um deles. Eu infelizmente não vou estar e não vou ter acesso a esta «Lunch Box», um objecto efémero, que pessoalmente não seria capaz de utilizar e iria guardar como uma fina peça de porcelana.