quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Votos de Feliz Ano de 2010


VOTOS DE BOM ANO NOVO

MUITA SAÚDE

FELICIDADE


BOAS DEGUSTAÇÕES



BONS LIVROS

Nota: A primeira foto, embora pareça fogo de artifício, mostra a iluminação de um restaurante em Valencia.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Rebuçados de Ovos de Portalegre

Recebi hoje um saquinho de rebuçados de ovos de Portalegre. Um presente que adoro e que guardo religiosamente no frigorífico e vou comendo até acabarem.

A origem desta doçaria é atribuída às freiras do Convento de Santa Clara, em Portalegre. Este convento hoje transformado em Biblioteca Municipal, era famoso pelo fabrico de vários bolos, para além destes. A lista é longa e inclui o queijo dourado, o doce de amêndoa, o toucinho-do-céu, o manjar branco, os pastéis de Santa Clara, o presunto doce, entre outros.

Os rebuçados são confeccionados apenas com ovos e açúcar e a sua origem remonta ao século XVIII.
Alfredo Saramago, no livro Doçaria Conventual do Alentejo, infelizmente sem nunca citar fontes, refere-se a outros rebuçados de ovos, como os da Madre Teresa do Convento do Salvador e outros do Convento de S. Bernardo, ambos em Évora.

Em Portalegre, os rebuçados são vendidos em casas particulares, mas, desde 2006, foram também comercializados, numa produção mais industrializada, pela empresa Sabores de Santa Clara. Sob a marca «Fábrica do Rebuçado», estes são apresentados em latas atractivas, de cor amarela e preta, nas quantidades de 6, 12 e 18 rebuçados.
Não quero despertar inveja, mas o meu presente foi um saco, de fabrico particular, que tem seguramente mais de meio quilo de rebuçados. Vou-me deliciar.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

A alimentação do Pai Natal: um mistério

Sendo o Pai Natal gordinho seria de imaginar que a sua alimentação fosse abundante.
Decidi procurar que tipos de alimentos comeria para atingir este grau de adiposidade.
Tenho uma colecção grande de postais e comecei por procurar imagens do Pai Natal. Foi sem grande surpresa que constatei que o mesmo é um sacrificado. Farta-se de trabalhar. Começa por ter que ler aquelas cartas todas que os meninos enviam com os seus desejos. Depois deve ter que comprar as prendas. No final tem a árdua tarefa de os distribuir. E não é fácil uma vez que ninguém lhe abre a porta. O desgraçado tem que descer pela chaminé, deixar os presentes, e voltar pelo mesmo caminho. No final seria de prever que teria alguma compensação. Um banquete ou pelo menos uma boa refeição. Mas tal não deve acontecer. Não há imagens do Pai Natal a comer.

Experimentem procurar. À excepção da bebida Coca-Cola, que impulsionou a sua imagem para o nosso quotidiano, não há praticamente representações suas associadas à comida. Procurei na internet com várias palavras e em várias línguas. Não encontrei nada.
Por sorte num dos meus postais vê-se o Pai Natal a confecionar bolos. Devia estar desesperado de fome. Nos restantes é representado sempre a trabalhar com o seu inefável sorriso.

Em conclusão: a alimentação do Pai Natal é um mistério bem guardado. Nada se sabe. Provavelmente o seu ar anafado deve-se à sua alimentação antes do período natalício. Durante este não me parece que tenha tempo para comer.
Uma sugestão para o próximo Natal: porque não deixar uma reforço de iguarias junto à lareira para o compensar? Acho que iria ficar feliz.

Um Bom Natal a todos.

domingo, 20 de dezembro de 2009

Objecto Mistério Nº 13. Resposta: Palito portátil


Está de parabéns o primeiro anónimo que foi quem tornou evidente a utilidade do objecto.

É verdade, este instrumento tem um palito em cada um dos braços. Parece que era fácil.
Não abri a boneca, mas ao fazê-lo constata-se que as pernas têm também uma função: serviam para limpar os ouvidos. Esta associação, que nos parece absurda era frequente.
Neste exemplo, existente num museu, vemos um objecto com múltiplas funções. Além do apito, tem um palito, uma lâmina para limpar as unhas e um objecto para limpar os ouvidos. O conjunto era suspenso de um fio em ouro, tornando-o muito prático. Foi encontrado nos destroços do navio Atocha, que se afundou em 1622.

A associação mais frequente, presentemente, é contudo a presença do palito nas navalhas mais complexas. O palito é o objecto dentário mais antigo e a sua história sobrepõem-se à da alimentação do homem. Em túmulos pré-históricos foram encontrados palitos em bronze, em osso, feitos de penas de aves, com conchas, etc.

Mas foi no século XVII que os palitos se transformaram em objectos de luxo, semelhantes a jóias. Eram feitos em metais nobres, como prata ou ouro e podiam ser esmaltados ou ter pedras preciosas. Eram transportados pelos seus donos, quando se deslocavam, para serem usados nas refeições.
A primeira fábrica de palitos de madeira surgiu nos Estados Unidos, em 1869, por iniciativa de Carles Forster. Referimos-nos ao seu fabrico industrial, porque a produção manual perde-se nos tempos.
A propósito recordo o filme português de 1962, «O Milionário», de Perdigão Queiroga, com Raul Solnado, Costa Ferreira e Clara Rocha. Nele Raul Solnado interpreta o papel de um homem que se chama Milionário e é fabricante e distribuidor de palitos. Quando o negócio se expande é-lhe feita uma proposta de compra da fábrica. Na realidade não existia qualquer fábrica e toda a produção era feita pelos adultos e crianças do bairro que, à noite, se reuniam para fazer os palitos. Um filme, de uma ingenuidade tocante, que recomendo.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Objecto Mistério Nº 13

O objecto mistério de hoje é um objecto utilitário, requintado, para ser usado na intimidade.

Penso que data do final do século XIX ou início do século XX.

A cabeça e os membros são num material plástico, semelhante a marfim e o corpo é em tartaruga.

A cabeça tem um centímetro e o corpo 7 cm.
Qual a sua utilidade?

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

O Louvor do Sal

Ó Sal, pedrinha estimada,
Que vais à mesa do rei,
Não te conheço soberbas,
por isso te louvarei!

Tu és o mesmo p’ra todos,
Linda gotinha de neve.
És p’ra nobreza em palácio
O que és p’ra um triste almocreve.

Pode na casa do pobre
não haver luz, faltar pão,
andar por fora a saúde,
mas lá o Sal é que não!

As naus antigas do Quinto
Traziam pedras custosas.
Pouca valia era a delas
Ao pé daquela que gozas.

Contigo um prato de açorda
Sabe a um divino manjar...
Sem ti, que são iguarias?
Só servem p’ra enfastiar!
António Sardinha
Epopeia da Planície. Poemas da terra e do sangue.
1915

sábado, 12 de dezembro de 2009

A verdadeira reciclagem

Nos últimos anos temos sido alvo de campanhas a incentivar a reciclagem. Devo dizer que sou uma fervorosa adepta e que separo os meu lixo rigorosamente, de acordo com a tipologia.

É verdade que já tenho pensado que se a reciclagem tivesse começado há 30 anos eu dificilmente teria hoje acesso a objectos de uso comum, como os potes de vidro de iogurte ou as garrafas de refrigerantes. E sempre que há uma campanha de recolha de pequenos electrodomésticos, não consigo deixar de pensar: “Lá vão desaparecer mais alguns exemplares de design interessantes”. Tudo isto vem a propósito de uns sacos de pano que encontrei no meio dos panos de cozinha que vou juntando. Trata-se de um saco de arroz da Sociedade Industrial de Vila Franca, SARL, de 5 Kg, um saco de arroz de 1 kg da Cooperativa TPA do Vale do Sorraia e um outro de farinha de mandioca “Carioca”. Estão um pouco descorados pela lavagem, o que comprova o seu uso intensivo.

Quando olhei para eles fiquei a pensar que na realidade não fazemos qualquer reciclagem. Limitamo-nos a separar produtos idênticos, que alguém vai depois reciclar. Mas a nova reciclagem implica a destruição do objecto existente para fabricação de novos produtos.
Em Portugal, até aos anos 70, todas as donas de casa faziam reciclagem dos objectos que entravam no domicílio. Ninguém deitava os frascos ou as garrafas fora. Guardavam-nas e utilizavam-nas depois para outro fim. Os papéis, mesmo os de embrulho, eram esticados e guardados para novos embrulhos. E as embalagens dos alimentos tinham sempre um novo destino.
Neste caso, os sacos de pano de produtos alimentares, eram usados para guardar cereais ou leguminosas, ou, no caso dos maiores, para sacos de pão. Tudo era reutilizado. As noções de economia doméstica tinham- se implantado e as dificuldades económicas do país justificavam essas atitudes.

Quando aderimos à sociedade de consumo começámos a deitar as coisas fora. As casas mais pequenas também não facilitavam a acumulação de objectos. Quando se começaram a divulgar os conceitos de separação de lixo os portugueses aderiram bem, pelo menos nas grandes cidades. Mas olhando para trás, podemos concluir que a verdadeira reciclagem era feita antigamente quando, sem destruir os objectos, lhes eram atribuídos novos destinos. Temos ainda muito que aprender.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O requeijão e a travia da Beira Baixa

Quando era pequena costumava ir com o meu pai comprar queijo fresco e requeijão à Quinta do Pinheiro. Era uma quinta que ficava numa das saídas da Covilhã e cujo nome se devia a um enorme pinheiro, centenário que, dizia-se, eram preciso vários homens de mãos dadas para o abraçar.
Tinha uma casa grande de pedra com uma cozinha escura. A chaminé enorme, era daquelas em que as pessoas se sentavam lá dentro, de cada lado do fogo, em pequenas cadeiras. Lembro-me de ver no centro da lareira um caldeirão de ferro, suspenso por uma cadeia, onde fervia um líquido branco, mexido com uma grande colher de pau, que era o requeijão. Foi assim que aprendi como se fazia o requeijão.
Um dia um raio atingiu o pinheiro que desapareceu. Mais tarde foi a fúria construtiva, devido ao crescimento da cidade que destruiu a casa e levou á ocupação do terreno com prédios de vários andares, incaracterísticos, que se vêm agora no local.

Fiquei sempre com a memória daquele requeijão, que em minha casa se comia com açúcar e canela. Apesar de se dizer que na Beira Baixa é tradicional comer o requeijão com doce de abóbora, nunca conheci ninguém que o fizesse nessa época.
Continuei sempre a comer o requeijão como me recordava dele. Quando cheguei a Lisboa acontecia-me comprar um requeijão condensado e salgado. Havia mesmo lisboetas que o comiam com sal e pimenta. Quando inadvertidamente comprava um desses, punha-o de molho em água, para tirar o sal e juntava-lhe depois um pouco de leite. Sem saber estava a aproximá-lo da ideia de travia.
Tanto o requeijão como a travia são subprodutos do fabrico do queijo e ambos se obtém pela precipitação ou coagulação, por acção do calor, da lacto-albumina e lacto-globulina existentes no soro que resulta do fabrico dos queijos. O requeijão tem o feitio de um pequeno queijo e era vendido individualmente em pequenos cestos de verga. Estes foram depois substituídos por cestos em plástico, ou vendidos embrulhados em papel vegetal timbrado. Mais modernamente são vendidos em embalagens plastificadas.
A travia é semelhante ao requeijão mas apresenta-se sob a forma líquida, por ter adicionado algum soro. Toma portanto a forma do recipiente que a contém. Vendidas tradicionalmente na região de Alcains ao litro, transportadas em embalagens designadas “ferrados”, é hoje vendida em caixas de plástico. A travia da Beira Baixa é hoje um produto DO, isto é, com denominação de origem, e são lhe exigidas determinadas características.
É difícil de encontrar fora da zona de produção, mas recomendo que a experimentem. O seu sabor láctico adocicado torna-o um prazer. A mim transporta-me à infância.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

O Pirolito

O pirolito foi uma bebida muito apreciada durante a primeira metade do século XX. Ficou no imaginário dos que a conheceram não só pelo seu gosto, mas também pela forma da garrafa.
Era uma bebida gaseificada, feita á base de um xarope feito com açúcar, água, ácido cítrico e essência de limão, a que posteriormente era adicionado gás carbónico. A receita deste xarope base variava de fábrica para fábrica, constituindo esse o seu segredo. Para quem não a experimentou, pode dizer-se que o mais parecido, hoje em dia, é o Seven-Up.
Hiram Codd (1838-1887)
Apesar do nosso apego à forma da garrafa o seu formato não é português. A garrafa de pirolito foi inventada por um inglês, Hiram Codd, que registou a patente em 1872. Foi criada com o fim de ser usada para bebidas gaseificadas, como a soda, águas minerais, limonadas e foi usada em toda a Europa e Estados Unidos.
O formato da garrafa, também conhecida por «frasco de bola», distinguia-a de todas as outras bebidas gaseificadas. Tinha uma forma cilíndrica na base, encimada por um gargalo cónico, com um aro de borracha na extremidade superior, que se destinava a fechar hermeticamente a bebida por intermédio de uma bola de vidro. Esta bola de vidro transformava-se num berlinde, apreciado pelos rapazes, quando se partiam as garrafas, usados depois no jogo do berlinde. Um estreitamento bilateral no gargalo, como se fosse feito por dois dedos, permita fixar o berlinde, depois de aberta. Para abrir a garrafa bastava carregar no berlinde e este descia para a sua cavidade própria no gargalo. Ao pegarmos numa garrafa de pirolito ouvimos o som inconfundível do berlinde a bater nas paredes da garrafa.
Quando comecei a procurar a fábrica original de pirolitos, descobri que não era possível saber qual foi a primeira. Em Portugal houve inúmeras fábricas de pirolitos, distribuídas por todo o território. Assim, cada pessoa que conheceu o pirolito acha que o da sua zona foi o primitivo.

Mencionarei algumas das fábricas que encontrei numa busca não exaustiva.
Em Aveiro, em 1922, existiam 2 fábricas de pirolitos, de acordo com os jornais regionais. Em Caria existiu uma fábrica de pirolitos. No Barreiro há referência, em 1927, a uma fábrica de Pirolitos de José Gouveia e o mesmo se passou em Estremoz com a Fábrica do Massano. Em Guetim (Espinho) existiu uma fábrica de pirolitos, feitos com a água da Gruta da Lomba.
Na baixa de Coimbra, há cerca de 80 anos existia uma fábrica de pirolitos, no local onde hoje se encontra o restaurante Carmina de Matos.
Nos Açores existiram várias fábricas de pirolitos: a de Francisco Pereira de Vasconcelos, cerca dos anos 30, na Ilha Terceira , a Fábrica da Rua dos Canos Verdes e a de Melo Abreu, em Ponta Delgada.
Há igualmente referência a fábricas em S. Jorge da Panasqueira, no Louriçal, no Alandroal e em Perafita.
Em Sesimbra existiu, em 1935, a Marítima, de Jorge Amaro Reis Neves.
No Redondo existiram pelo menos duas fábricas: a do Botas, que utilizava a água da Fonte da Bicha e a Fábrica de refrigerantes da Serra d’ Ossa.
Na Marinha Grande existiu a Fábrica de pirolitos e gasosas de Antunes & Reis, em 1929, e em Castelo de Vide a fábrica de Olímpio Gonçalves Novo (1899 – 1960). Esta última com uma referência especial pelo estudo que foi feito sobre esta empresa, e que se encontra disponível no site do Museu de Castelo de Vide.
Também na Venda do Pinheiro, em 1926, Francisco Alves começou a produzir pirolitos, para além de outros refrigerantes. Esta empresa então designada Francisco Alves e Filhos, viria também a produzir a Laranjina C e mais tarde, nos anos 70, a Trinaranjus. Em 1990, foi adquirida pelo grupo Cadbury-Schweppes Portugal, SA.

Na Lourinhã existiu uma fábrica que era propriedade de José Maria de Carvalho e há referência à existência de duas fábricas de pirolitos no Concelho do Cadaval, uma na própria vila do Cadaval, cerca dos anos 30 e outra, no Vilar, no final dos anos 40.

Esta lista de fábricas de pirolitos mostra-nos que devem ter havido muito mais, uma vez que se tratava de uma produção familiar e cuja distribuição era normalmente regional.
Em comum existiam as garrafas fabricadas na Marinha Grande. Do que nos foi possível constatar existiam vários tipos de garrafas. Embora o modelo seja o mesmo os tamanhos e o tipo de vidro variam ligeiramente. Isto deve-se a que eram fabricadas em várias fábricas. Algumas garrafas não tinham qualquer identificação na base, enquanto outras apresentam as marcas das fábricas em que eram produzidas. Identificamos as seguintes marcas: SB- correspondendo á Vidreira Santos Barosa, RG que se refere à fábrica de Ricardo Santos Gallo, CV à Companhia Industrial Vidreira e ainda as marcas DS e P, que desconheço a que fábricas pertencem.

Nos anos 50, preocupações com a higiene levaram a uma legislação que obrigou os fabricantes a melhoramentos nas suas fábricas e à proibição de utilizar este tipo de garrafa de bola, por ser de difícil lavagem. Com resultado muitas fábricas de pirolitos foram obrigadas a fechar.

Acabaram os pirolitos. Ficou-nos a memória.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

O cacau Betke

Há uma diferença entre o cacau quente e o chocolate quente, embora haja quem use estes nomes de forma indistinta.
O cacau quente é feito com o pó do cacau, isto é, dos grãos do Theobroma cacao, a que foi extraída a gordura ou manteiga de cacau.
O chocolate quente, hoje em dia, é feito com chocolate em barra ou em pastilhas, derretido, até obter creme. Estas definições só fazem sentido depois que, em meados do século XIX, se industrializou o processo de fabricação. Em 1828, na Holanda, Coenrad J. Van Houten (1801-1887) descobriu um processo para tratar o cacau. Utilizando uma eficiente prensa hidráulica, obtinha um “bolo” que era depois pulverizado em pó fino. Este era em seguida tratado, através de sais alcalinos, tornando-se num pó de cacau mais solúvel na água e mais facilmente digestível.
A esse processo chamou-se «Método Holandês». E foi provavelmente devido a isso que os melhores cacaus em pó foram, e ainda são, de origem holandesa.
Quando, em 1838, expirou a patente, outras empresas começaram a fazer novos produtos em chocolate, como o chocolate em barra, feito pela primeira vez, em 1847, pelo inglês J.S. Fry & Sons.
A partir de 1850 a empresa Van Houten, começou a exportação dos seus produtos. A firma utilizou precocemente a publicidade para divulgar os seus produtos. O mesmo se iria passar com outras empresas holandesas que passaram a produzir o cacau em pó pelo processo «Dutch», de que resultou o aparecimento de empresas como a Droste, a Bensdorp, De Beukelaer e a Betke.
É sobre esta último que queremos falar. O cacau desta marca foi importado para Portugal pela empresa J. P. da Conceição & Ribas, que se intitulava único importador para o nosso país. Situava-se na Rua dos Bacalhoeiros, 121, 1º em Lisboa.
Encontramos anúncios ao cacau Betke no jornal «A Capital» de 27 de Maio de 1913 e também numa publicação não datada, igualmente de 1913, «O Anunciador Artístico».
A lata apresentada nos anúncios corresponde ao formato usual nos anos 10-20, com base de formato rectangular.
Cerca de 1920-1925 a mesma lata aparecia no mercado em cores mais vivas, encarnadas ou verdes. Interessantemente, nos anos 40, na Holanda, após a invasão nazi, só era permitida a sua venda quando o nome Betke estava tapado. Era então vendida em latas idênticas, com a mesma cartela central e sem identificação do nome.
Em Portugal perdemos-lhe o rasto depois destes anúncios e não encontramos outras referências, ignorando quando deixou de ser importada. Fica apenas este registo, a aguardar novos acréscimos de informação.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

O gato preto de Pierre Probst

Ofereceram-me um postal com um gato pescador. É um postal de cores berrantes e o contraste é feito pelo preto, num material aveludado. Há muito tempo que não via um postal destes. Mas o mais engraçado era a temática. O gato, vestido de pescador, com um chapéu na cabeça com isco na borda do chapéu e uns calções tiroleses, segura numa das mãos uma cana de pesca e na outra um grande peixe. No seu ar feliz, com a língua de fora, faz-nos adivinhar o destino imediato do peixe.
O postal data de 1961 e foi publicado pela Edições Hachette. Mesmo na frente vem identificado como sendo da autoria de Pierre Probst. Pierre Probst foi um ilustrador de livros de crianças. Foi o criador da figura de Caroline e de um conjunto de animais seus amigos, como gatos, cães, ursos, leões e panteras.
As aventuras de Caroline e dos seus amigos, com diferentes nomes nos vários países foram um sucesso. O gato aqui apresentado chama-se Noiraud em França, Inky nos Estados Unidos, Smokey em Inglaterra e Bauz na Alemanha. Penso que em português seria Farrusco.

Nascido na Alsácia em 1913, Pierre Probst iniciou-se nas artes gráficas e começou a trabalhar en publicidade. Foi em Lion que se dedicou aos desenhos infantis, tendo, a partir de 1946, passado a fazer parte da Hachette.
O seu trabalho teve grande sucesso nos anos 50 e 60 sendo traduzido em mais de 15 países. Em Portugal só uma parte da sua obra foi traduzida. Nos finais dos anos 60 foram traduzidos dois livros em que apenas as ilustrações eram da sua autoria. Em 1975 Maria Alberta Meneres traduziu «Martim e o urso de Vilarim», «Martim e a cabra branca» e «Martim e a cegonha» , que eu não li. É provável que Martim seja o nome dado a Fanfan, uma sua criação de 1966, um jovem amante da natureza, rodeado por pequenos animais.
O gato "Farrusco" ao lado de Caroline na viagem para a lua.

Probst trabalhou também nos anos 50 com Enid Blyton.
Morreu em Abril de 2007 em Suresnes, perto de Paris.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Ticiano e Veronese

Ticiano, Mulher com Taça de Frutas. c.1555. Staatliche Museu, Berlin

Há alguns anos atrás, uma amiga pediu-me para a acompanhar para lhe dar opinião sobre uma casa que pretendia comprar.
Ao entrar na sala de jantar deparei-me com vários quadros a óleo nas paredes. Os quadros existentes nessa sala eram os primeiros estudos de um conceituado pintor ainda vivo. Numa outra sala estava um quadro de grandes dimensões, que representava uma mulher com um prato com frutas e flores.
A minha amiga acabou por comprar a casa e eu comprei dois quadros. Um quadro realista português, representando uma refeição de uma família minhota e um outro quadro que, então me foi descrito, como sendo um estudo académico do século XIX, sobre um quadro de Veronese.

Tenho-o na sala de jantar e durante anos procurei, em vão, nos quadros de Veronese identificar aquela personagem. Nunca a encontrei. Mas olhava para ela e sentia nela aquela pujança das mulheres pintadas por Veronese.
Há poucos dias deparei-me com um postal ilustrado que representava o «Retrato da filha de Ticiano», pintado por este. Olhei e lá estava a jovem que sempre acreditara ser obra de Veronese. A mesma posição, o mesmo vestido, mas em vez do prato com frutas segura uma caixa-cofre renascença. Comecei a procurar pinturas idênticas de Ticiano e descobri que este usou a sua filha Lavínia em vários dos seus quadros. Com o mesmo motivo existem pinturas e desenhos que mostram a sua filha numa difícil posição, em pé de costas, com a cabeça ligeiramente virada para o observador e com os braços levantados segurando em vários objectos.
Senti-me enganada e procurei uma explicação para o meu logro.
Ticiano (Tiziano Vecellio) (cerca 1485-1576) nasceu em Pieve di Cadore, Itália, e aos 10 anos foi para Veneza. Em 1516 já era pintor da República de Veneza, mas a sua obra extendeu-se a outras corte europeias. Foi o mais importante pintor da sua época e a sua influência extendeu-se por gerações.

Veronese (Paolo Caliari) era mais novo e nasceu em Verona em 1528. Por volta de 1550 foi para Veneza, onde rapidamente conseguiu obter encomendas para igrejas e para o palácio dos Doges. Ticiano tornou-o seu protegido, facto que não seria alheio à rivalidade existente com Tintoretto. A influência de Ticiano na obra de Veronese é conhecida.
Foi esta rivalidade existente entre os três pintores Ticiano, Tintoretto e Veronese, em Veneza, entre 1540 e 1590, que levou a uma profusão de novas ideias e obras, consideradas expoentes máximos da Renascença.

É sobre este tema que se encontra exposta no Museu do Louvre uma exposição de pintura «Titien, Tintoret, Véronèse. Rivalités à Venise», extraordinária, como todas as exposições on-line deste museu, pelo que aconselho a darem um salto ao Louvre virtual e a não a perderem.

Pode dizer-se que o achado desta exposição não podia vir mais a propósito, na altura em que descubro o meu engano na atribuição ao autor do quadro que um dia pintou o original. Apesar da rivalidade, alguma influência tiveram entre si estes pintores, sobretudo na utilização de composições semelhantes e no tipo das figuras.
Daí, não ser tão estranho eu, na minha ignorância, aceitar a atribuição do quadro a Veronese. Fiquei confusa com a descoberta, mas nada mudou. Continuo a olhar para o quadro com o mesmo prazer. Agora sei que a jovem se chamou Lavínia, era filha de Ticiano e uma das suas modelos preferidos.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Livro «Receitas e Truques para Doentes Oncológicos»

O meu livro «Receitas e Truques para Doentes Oncológicos» ficou finalmente pronto, depois de uma série de peripécias que levaram ao atraso da publicação. Estas passaram por um acto de ingenuidade minha, que me levou a concorrer a um prémio de Nutrição Comunitária, aos contactos demorados com uma editora que se mostrou interessada em o publicar, para finalmente me decidir a fazer uma edição de autor.

Para a realização do livro contactei um cozinheiro competente para fazer e apresentar os pratos, mas os adiamentos sucessivos levaram-me a decidir ser eu a confecionar os pratos.
Segui-se o problema do fotógrafo. As fotografias de comidas são feitas por fotógrafos especializados que se fazem pagar bem.
Como não havia verba para esse fim decidi aprender como se fotografa comida. Li o que havia disponível na internet e fui aos sites e blogs mais premiados para perceber as últimas tendências do “stiling of food”. Fui fazendo experiências e com o tempo fui melhorando. No final do livro estou já mais habilitada para começar um outro livro.

Finalmente o livro ficou pronto. Felizmente contei com a colaboração de um gráfico, o sr. Adelino Domingos, da Rios de Tinta, com quem já havia trabalhado anteriormente, para conceber o lay-out do livro.
Tenho agora que fazer a sua distribuição, o que me parece que não vai ser fácil. Tentei fugir ao esquema das editoras e distribuidoras, mas já recebi a primeira resposta de que não aceitam edições de autor. Aconselharam-me a contactar uma distribuidora. Como sou teimosa, não desisti ainda. Espero vir a colocar o livro nas livrarias dos hospitais das principais cidades.

Para já está à venda pela internet, através deste blog. É por isso que adianto estas explicações. Em Portugal, quando queremos fazer alguma coisa encontramos sempre alguns obstáculos. Há que aprender a contorná-los.

Sempre tive urgência na publicação deste livro, porque sei por experiência própria, que os doentes oncológicos consideram o problema da alimentação como crucial.
Muitos dos conceitos nele apresentados são gerais e internacionais, e do conhecimento da maioria dos hematologistas e dos oncologistas, que os transmitem aos doentes no espaço de tempo das consultas, curto para tanta informação.
Outros são conhecimentos que fui adquirindo na minha vida profissional, mas sobretudo na experiência familiar vivida.
Por fim, a parte onde se integram as receitas traduz os meus conhecimentos de culinária e os meus gostos pessoais. Foram pensadas para se adaptarem a pessoas com dificuldades na alimentação e com necessidades de refeições mais calóricas, com maior aporte de proteínas e mais fáceis de comer.

O livro aí está e faço votos para que seja útil a um grande número de doentes oncológicos e que lhes melhore e facilite a vida e a dos seus familiares.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Ovas de Sardinha. O Caviar Português

No sábado passado entrei numa mercearia frente ao mercado da Ribeira para comprar conservas. Escolhi diferentes variedades em que se incluíam anchovas, atum e ovas de sardinha.
A conta elevada surpreendeu-me. Ao comentar o preço com o empregado da loja ele elucidou-me: «O que pesa na conta são as ovas de sardinha. São consideradas o caviar português».
Sou uma grande apreciadora de ovas cozinhadas de todas as maneiras: cozidas, fritas, grelhadas, em caril, etc., mas confesso que nunca tinha experimentado ovas de sardinha em conserva.

À venda existiam também ovas de cavala, mais baratas. Tanto umas como as outras podem ser adquiridas em azeite ou em óleo, sendo a primeira opção evidentemente mais cara.
Alguns cozinheiros, neste momento, estão a incluí-las nas ementas como entrada, transformando-as num produto gourmet.
Fui depois informar-me sobre os preços de mercado e constatei que o preço das embalagens de ovas de sardinha (120 g), de várias marcas, varia entre 12 e 17 euros.
Compreendi então porque lhe chamam o «caviar português».

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Uma ementa de "A Garrett"

Segundo afirma Cecília Barreira, as pastelarias mais importantes dos anos vinte, em Lisboa, eram a Bénard, a Bijou, a Ferrari, a Pastelaria dos Grandes Armazéns do Chiado e a Garrett.
É sobre esta última que falaremos a propósito de uma ementa.

A refeição foi servida em Torres Vedras a 22 de Agosto de 1926. Ainda muito ao gosto francês, que imperara no século XIX nas mesas requintadas, apresenta-se toda escrita em francês. Era constituída por Poisson, Entrée, Entremet e seguida de Dessert, e os pratos que a compunham encontram-se descriminados no verso.
A face anterior da ementa tem um grafismo Art Deco e foi feita na Litografia de Portugal, em Lisboa. Nela a “Garrett” é designada por Patisserie et Restaurant.

Qual era esta Garrett?
Mário Costa no «Chiado Pitoresco e Elegante» refere-se à Casa Garrett, situada no Chiado, no local onde viria a instalar-se o Hotel Borges, uma pastelaria do italiano Rembado que, em 1885, se transferiu para a Rua dos Capelistas tomando o nome Patisserie Garrett.
Mas em 1918 foi inaugurado no Chiado, no Largo das Duas Igrejas, a Pastelaria Garret, também conhecida por A Garrett do Chiado. Situava-se no prédio onde esteve a livraria do Diário de Notícias e está hoje a Maison Hermes.
Foi restaurante, pastelaria e casa de chá sendo um local muito concorrido pela sociedade lisboeta, onde era servido chá e havia concertos diários de boa música. Este local de encontro das «primeiras elegâncias femininas», nas palavras do Dr. João Ameal, foi à falência em 1934.

Para mim está instalada a dúvida, tanto mais que desconheço quando terminou a Patisserie Garrett da Rua dos Capelistas.
Por coincidência encontrei em arquivo menção a uma partitura de um fox trot “Foxy Maid”, da autoria de José Maria Navarro, publicado pela Sassetti e que foi um grande êxito do Quinteto Iberia, da Patisserie et Restaurant A Garrett.
Este achado faz-me pensar que é provável que a nova Pastelaria Garret, acompanhando a moda da utilização de língua francesa nas actividades sociais, tenha absorvido a designação da anterior casa, provavelmente já desaparecida. A falta de tempo para uma avaliação mais profunda, pode vir a revelar-me estar enganada. Se tal acontecer darei a mão à palmatória.

domingo, 1 de novembro de 2009

Plantas esquecidas: As cherovias

A cherovia é a raiz de uma planta da família das umbilíferas, em que se incluiem outros membros mais conhecidos como a cenoura, a salsa, o funcho e o aipo. O seu nome botânico é Pastinaca sativum.
É hoje pouco conhecida, excepto pelas pessoas originárias da região da Covilhã e do Fundão, uma vez que é na região da Serra da Estrela, em especial na Cova da Beira que tem o seu habitat.
Se bem que hoje seja uma desconhecida para a maioria das pessoas a sua apreciação como elemento da dieta humana tem uma longa história. Surgiram como plantas nativas na Europa, na região do Mediterraneo, e foram consideradas um alimento de luxo entre a aristocracia da Antiga Roma.
Apicius refere-se a elas, mas há dúvidas se seriam as raízes a que agora nos referimos, se outra variante de cenouras, também designada por pastinaca. O seu sabor inigualável, ligeiramente adocicado, levou a que fosse servida com mel ou em bolos com frutas.
Durante a Idade Média a cherovia continuou a ser apreciada e utilizada em pratos doces, na ausência de açúcar. Foi nessa época que surgiram novas variedades. Mas até à Renascença a história das cherovias confunde-se com a das cenouras.
As formas selvagens são hoje consideradas infestantes nalguns pontos dos Estados Unidos. Mas as formas cultivadas expandiram-se para as Ilhas Britânicas e Norte da Europa onde são apreciadas.
Em Portugal, se tiver oportunidade de adquirir alguns exemplares não deixe de aproveitar para sentir um gosto inexplicável. Não se compara com nada, por isso não me é possível descrevê-lo-

Para as escolher deve seguir os mesmos princípios do que quando escolhe cenouras. Escolha-as firmes, de preferência de tamanho uniforme para ficarem mais bonitas na apresentação. Pode escolhê-las de todos os tamanhos, mas evite as demasiado grandes que podem ter um talo fibroso. A forma mais habitual de as comer em Portugal é fritas depois de passadas por polme. Comece por descascá-las e corte-as em fatias finas, no sentido longitudinal. Coza-as em água com sal, evitando que cozam demasiado para não ficarem moles. Escorra-as e passe-as por polme e frite-as como se fossem peixinhos da horta. Podem acompanhar carne ou peixe. Pessoalmente acho que ficam melhor com carne, mas em minha casa comiam-se com arroz de tomate e rodelas de lulas também passadas por polme (calamares). Era uma refeição deliciosa.

Também podem ser usadas assadas no forno, mas confesso que nunca experimentei. São óptimas para fazer sopas em substituição das batatas.
Neste momento são já utilizadas em restaurantes modernos em receitas alternativas, mas nenhuma melhor que a tradicional. Comi no estrangeiro um prato em que apresentaram fatias fininhas, fritas em azeite como se fossem batatas. Como têm o feitio de cenoura resultavam de forma decorativa, mas no que respeita ao gosto foi um desastre.
Do ponto de vista alimentar é uma raiz com baixas calorias. Não tem gorduras, mas tem fibras, açúcar e hidratos de carbono. Têm também ácido fólico, cálcio e potássio.
Desconheço qualquer receita em livros antigos de culinária portugueses, mas no século XIX pelo menos 2 obras publicadas nos estados Unidos apresentavam receitas com cherovias: no livro de F.L. Gillette, intitulado "White House Cookbook", publicado em 1887 e no livro de Fannie Farmer “Boston Cooking-School Cook Book”, de 1869. Por fim quero dizer que tem sido feita desde há 2 anos uma feira de divulgação deste produto na Covilhã. Este ano, no início de Outubro decorreu a 2ª Festa da Cherovia. Já acabou, mas para o ano esteja atento e vá lá. Não espere contudo tanto tempo para as comer. Se for visitar aquela zona procure um restaurante que tenha cherovias na ementa e se não conseguir dê um salto à praça e vá comprar para experimentar em casa. Vale a pena.