terça-feira, 29 de junho de 2010

Chá Pólvora

Ao folhear uma revista Modas e Bordados, de Novembro de 1935, deparei-me com um artigo enviado por uma correspondente em Londres, de nome Miss Edy Gray, intitulado «Aqui Londres». Tratava-se de uma pequena crónica em que dava notícias da corte inglesa e das últimas modas na capital britânica.

Entre as várias notícias podia ler-se: «os chás mais raros e perfumados como o Lapsang, o Souchong e o Orange Pekoe, são vendidos como a última moda do militarismo, nas montras que primam e se excedem em originalidade, metidos numa embalagem do feitio de balas, polvarinhos, com esta simples legenda sugestiva “Chá pólvora”».
Vista à distancia, e sabendo nós hoje que se estava num período entre duas guerras mundiais, esta moda do militarismo, levada até ao chá, choca-nos.
Parece também haver aqui alguma confusão. Na realidade o chá pólvora (gunpowder tea) é uma variedade de chá verde que nada tem a ver com alguns dos tipos de chá mencionados na notícia.

Este chá é originário da província de Zhejiang, na China, e o seu nome advém do facto de apresentar as folhas enroladas em pequenas pérolas. Era um trabalho manual, hoje feito por máquinas, de que resultam pequenas bolas escuras que parecem grãos de pólvora e daí o nome.
O início da sua produção data da dinastia Tang (618–907). Continuou a ser produzido na China mesmo após a Segunda Guerra Mundial, mas com o advento do comunismo passou de grande exportador de chá, com mais de 50% do consumo, para 6% de exportação mundial. O chá marroquino é um variante do chá pólvora, feito com uma mistura deste, a que se adiciona açúcar e folhas de menta. Para quem já o esperimentou, de preferência in loco, é uma agradável recordação.

domingo, 27 de junho de 2010

"Clafoutis" de Cerejas


É tempo de cerejas.
Embora a melhor maneira de as consumir seja comê-las frescas, ao natural, ou misturadas em saladas de frutas, existem algumas boas receitas para fazer sobretudo quando se tem fácil acesso a elas.
As cerejas são uma boa fonte de β-caroteno, um precursor da vitamina A, mas também de vitaminas C e E. São ricas em fibras, potássio e em ferro.
Nesta receita utilizei as belas cerejas da Beira Baixa.

“Clafoutis” de cerejas
Para 6 pessoas (Por dose: Calorias – 227,5 kcal, proteínas - 11 g)
750 g de cerejas pretas
150 g de farinha
3 ovos
2 dl de leite
4 col de sopa de açúcar
1 noz de manteiga
1 pitada de sal
Faz-se uma massa semelhante à massa dos crepes. Põe-se a farinha numa taça, com os ovos inteiros, 1 pitada de sal e o açúcar e bate-se com um batedor de mão. Junta-se o leite e vai-se batendo. Deixa-se repousar durante 2 horas.
Cobre-se o fundo de uma forma de tarte com as cerejas, a que não se tira o caroço para ficar mais saboroso (opcional). Cobrem-se com a massa. Salpica-se bem com açúcar por cima e vai ao forno quente. Coze durante 40-45 minutos.


Serve-se morno acompanhado de natas batidas.
Esta sobremesa também pode ser feita com cerejas congeladas ou de conserva.

Pode também substituir-se as cerejas por morangos, ou outro fruto vermelho, ou por ameixas secas que se deixaram de molho em chá preto durante algumas horas.

Receita extraída do Livro “Receitas e Truques para Doentes Oncológicos”.

domingo, 20 de junho de 2010

Chocolate e Arquitectura

Quando se visita Barcelona há percursos que percorremos repetidamente. As Ramblas, claro, mas também o Passeio de Grácia, com as suas casas modernistas.
Falo hoje numa das principais dessas casas, a Casa Amattler, mesmo ao lado da Casa Battló. Foi desenhada por José Puig i Cadafalch como residência para a família do chocolateiro Antoni Amatller, tendo sido construída entre 1898 e 1900. Puig i Cadafalch (1867-1956) deu-lhe uma fachada neo-gótica, com muitos elementos cerâmicos vidrados, brasões e gárgulas em pedra. Em toda a fachada existe um simbolismo que a relaciona com a família e a sua actividade, mas que escapa à observação superficial.
A porta de entrada leva-nos a um átrio de onde parte uma escada em pedra, iluminada por um grande vitral. Desde a entrada podem ver-se esgrafitados na parede e esculturas de animais em pedra ao longo da escada.

Puig I Cadafalch foi um arquitecto da envergadura de Gaudi, mas infelizmente menos conhecido. Projectou vários edifícios em Barcelona, de entre os quais destaco a antiga fábrica de tecidos de Casimir Casaramona, onde hoje se situa a Caixa Forum, que foi recuperada e onde é possível ver várias exposições nos diferentes edifícios fabris. Um ponto mais a visitar em Barcelona.
Mas concentremo-nos no encomendador, o industrial Antoni Amattler, neto do fundador de uma das mais antigas fábricas de chocolate da Europa, a Fábrica Amattler, fundada em 1797 no bairro de Santa Maria del Mar, em Barcelona. Quando Antoni tomou conta do negócio, em 1872, fez uma nova fábrica em Sant Marti de Provençals, que equipou com a mais moderna maquinaria francesa e alemã.
Antoni Amattler tinha viajado pela Europa, era um homem culto, tendo-se tornado num patrono das artes. Investiu em publicidade de forma inovadora tendo utilizado desenhos de vários autores como Rafael Penagos e até Alphonse Mucha. Algumas dessas imagens podem ainda hoje ver-se nas embalagens de chocolate.
Em 1972 a fábrica foi comprada por Simon Coll, outro chocolateiro espanhol, com produção de chocolate desde 1840, que teve o cuidado de manter a qualidade e a apresentação já conhecidas.
A casa não é visitável sem marcação. Nela se situa o Instituto Amattler fundado em 1941 pela filha gerindo o extenso património cultural que seu pai deixou . No rés do chão da casa situa-se a loja que tem uma pequena exposição com fotografias da casa. Por sorte o espaço ocupado corresponde à zona da cozinha e da copa que fotografei. Na cozinha existe ainda o fogão de ferro e uma fornalha em ferro, de uma boca, com três registos em cobre, desenhados por Puig i Cadafach que representam flores. Na copa persiste um pequeno monta-cargas, fazendo-nos crer que seria no primeiro andar que se situava a copa anexa à sala de jantar, como era hábito nas habitações do século XIX. Interessantemente foi também nesta habitação que foi construído o primeiro elevador de Barcelona. O modernismo no verdadeiro sentido da palavra.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Museu Virtual: Caixas para Ovos

Nome do Objecto:
Caixa para Ovos

Descrição:
Caixa rectangular de arame com as dimensões de 18.5 x 14.5 cm. Reforçada exteriormente com folha de Flandres pintada de azul. É constituída por duas partes articuladas com 12 alvéolos redondos para ovos. Fecho simples e duas asas forradas de plástico azul.

Material:
Arame, folha de Flandres e tubo de plástico.

Época:
Anos 30-40

Marcas:
Não tem.

Origem:
Mercado espanhol (Barcelona).

Grupo a que pertence:
Equipamento culinário

Função Geral:
Recipiente para guardar ou transportar alimentos

Função Específica:
Para colocar ovos crus para transporte.

Nº inventário: 730


Objecto semelhante: 731

Nome do Objecto:
Caixa para Ovos
Descrição:
Caixa triangular em plástico com as dimensões aproximadas de de 18.5 x 18.5 x 18.5 cm. É constituída por duas partes articuladas com 12 alvéolos redondos para ovos. Três fechos de encaixe e pequena asa no canto superior.
Material:
Plástico de cor rosa claro, semelhando entrançado de verga.

Época:
Anos 50-60

Marca:
Osul

Origem:
Mercado português (Covilhã).

Grupo a que pertence:
Equipamento culinário

Função Geral:
Recipiente para guardar ou transportar alimentos

Função Específica:
Para colocar ovos crus para transporte.

Nº inventário: 731

terça-feira, 8 de junho de 2010

O trono de Santo António

Na minha adolescência, antes de vir viver para Lisboa, ouvia falar das festas populares e a descrição encantava-me. Parecia-me muito divertido que bandos de jovens percorressem os bairros antigos, vestidos de cores garridas e se divertissem nos arraiais.

No primeiro ano que cheguei a Lisboa lembro-me de ter posto pelas costas um xaile branco com flores e de ter ido com um grupo de amigos percorrer as ruas.
Havia música e esplanadas em todos os larguinhos de Alfama, onde as pessoas se sentavam em bancos de madeira, à volta de mesas, para comer sardinhas e saladas com pimentos assados nos fogareiros. Bebia-se sangria, mas não me lembro de grandes bebedeiras como se vêem hoje.
Nos anos seguintes as ruas ficaram cada vez mais cheias e os grupos acotovelavam-se, perdidos rua-abaixo rua-acima à procura de qualquer coisa que não acontecia.
Foi uma grande decepção para mim e desisti dos festejos dos santos populares.


Mas a ideia do trono de Santo António, que me lembro de ver nalguns bairros ficou-me na memória. Antigamente os miúdos pediam “cinco-réisinhos” que depois passou a “um tostãozinho para o Santo António”. No filme Pátio das Cantigas, de 1942, ficou imortalizada esta tradição.
Com tronos mais ou menos elaborados, alguns apenas feitos com caixas de sapatos em cartão, os miúdos pediam dinheiro. Com o passar do tempo e o sentido prático que caracteriza esta sociedade, desde há algum tempo já surgem crianças a pedir o “tostãozinho”, sem sequer saberem que existem tronos.
Desde há vários anos que tinha vontade de fazer um trono de Santo António.
O Santo António já eu tinha, mas faltava-me o escadório que cheguei a encomendar a um marceneiro, para depois o pintar. Nunca foi feito.
O ano passado comprei uma presépio de Estremoz antigo . Este ano o escadório em barro serviu-me de base para o pequeno altar.

Ficou um misto de trono, nome porque é conhecido o altar em Lisboa e de cascata, designação pela qual o mesmo é designado no Porto, destinando-se aqui ao S. João.

Segundo Helder Pacheco (1) as cascatas do Porto, que surgiram no século XIX, sendo portanto mais recentes que o trono de Santo António, derivam dos presépios. Nelas a sagrada família e os reis magos desapareciam, ficando as restantes figuras e incluía-se o S. João.

A minha adaptação com escadório e a figura central do santo popular de Lisboa ficou muito satisfatória.
Faltam-me as velas nos candelabros e os pequenos vasos de manjerico que ainda não comprei.

Como vou estar ausente deixo-lhes já o meu Santo António, com votos de felizes Santos Populares.

(1)Anabela Couto e Hugo Manuel Correia, JPN – Jornalismo Porto Net, 23-6-2005

domingo, 6 de junho de 2010

Flores Comestíveis

Salada de Alface com Capuchinhas

Como prometi, depois de falar da borragem, refiro hoje outras flores comestíveis.

O número de flores comestíveis é imenso mas menciono apenas algumas.
São comestíveis as capuchinhas, as rosas, as begónias, as calêndulas, os amores-perfeitos e as violetas (mas não as violetas africanas), os crisântemos, as flores de alfazema, as cravinas, as flores do alho e alhinho, da abóbora e da aboborinha, da rúcula, do funcho, do sabugueiro e da laranjeira.

Flores de Laranjeira

De um modo geral os vinagres e os azeites podem ser aromatizados com flores. Adicionadas às saladas torna-as mais bonitas e saborosas.
Algumas servem para cristalizar e com já disse anteriormente, aquelas que beneficiam o gosto das bebidas, podem ser introduzidas em cubos de gelo.

Comecemos pelas capuchinhas de que apresento aqui uma salada de alface com capuchinhas, uma boa utilização pelo contraste na cor e no sabor, o que se aplica a qualquer tipo de salada verde.


A rosa, com as suas pétalas inteiras ou picadas, pode ser usada em saladas de frutas ou de verduras, ou em geleias. Lembro-me de há muitos anos ter feito uma geleia de pétalas de rosa que foi um sucesso. Utilize-as sobretudo nas sobremesas. Os botões de rosa podem ser conservados em vinagre como pickles ou adicionados ao chá depois de secos.
Consideram-se as variedades com flores mais escuras como tendo um gosto mais intenso.

Botões de Rosa

A calêndula (Calendula officinalis) pode dar uma cor viva e um gosto diferente às saladas. As pétalas de cor laranja podem ser metidas em leite quente, transmitindo-lhe a sua cor e sabor, sendo depois ser utilizadas em arroz, bolos, pães, quiches, omeletes, etc. São também usadas para intensificar a cor da manteiga e dos queijos. Podem apenas ser salpicadas sobre a sopa, as massas ou saladas.

As flores do alho, de todas as suas variedades (há cerca de 400 espécies) utilizam-se sobretudo em saladas, mas têm também utilização em sopas.

A lavanda (Lavandula officinalis) tem pequenas flores que servem para aromatizar pão e bolos.

As flores da abóbora e da aboborinha são muito utilizadas na cozinha italiana, sendo consumidas passadas por polme e fritas ou recheadas com queijo. Também é boa adicionada a risotos e saladas. Quem já experimentou não pode deixar de apreciar.

As pétalas do cravo e cravina são usadas em saladas de fruta ou em tartes de fruta. Servem também para aromatizar vinagres, açúcar e bebidas açucaradas. Podem igualmente ser usadas para decorar bolos, se forem pinceladas com clara de ovo e cobertas de açúcar, tal como as pétalas de rosa. O corante que se extrai delas é usado em confeitaria.

O amor-perfeito e a violeta (mas não a violeta-africana) saõ bons para adicionara a saladas, fazendo um bonito contraste ou para ser cristalizada e usada em pastelaria.

As flores de aneto ou funcho são utilizadas para pickles de vegetais.


Funcho em flor

Por fim alguns conselhos. Embora pareça tudo fácil é necessário tomar alguns cuidados. Em primeiro lugar nunca se devem usar flores compradas em floristas ou de proveniência desconhecida porque têm normalmente produtos químicos.

É aconselhável ter a certeza que são as flores certas e não são tóxicas.
Se puder colha-as antes de as utilizar e lave-as sempre.
Retire-lhes os estames e aproveite apenas a folha. No caso da rosa retire também a parte branca.

Não se entusiasme e consuma-as em pequena quantidade, em especial nas primeiras vezes que as experimentar.
Bom apetite!.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Planta Mistério Nº2. Resposta: Borragem

Trata-se da borragem ou Borago officinalis L. que é uma pequena planta herbácea que cresce na região do Mediterrâneo, nas bordas dos caminhos e das hortas.
Nalgumas zonas é utilizada como legume, utilizando-se então as folhas mais jovens. Ainda não há muito tempo, num Hotel, foi-nos oferecido como primeiro prato folhas de borragem cozidas, temperadas com azeite e alho (1).
O seu cultivo é feito principalmente para a produção de sementes.

Falemos em primeiro lugar das suas capacidades medicinais, como nos indica a expressão officinalis, que se usava antigamente para plantas com propriedades medicinais conhecidas.
É considerada diurética, emoliente e sudorífera, sendo tradicionalmente usada para controlar os sintomas da gripe e infecções respiratórias, por ter propriedades anti-inflamatórias.
Por ter constituintes salinos promove a actividade renal e é também usada nas afecções das vias urinárias. É referida como tendo acção para aliviar a tensão pré-menstrual e os sintomas pós-menopáusicos.
Na literatura antiga era-lhe atribuída uma outra acção muito curiosa, que era a de estimular o espírito, tornando as pessoas mais optimistas. Uma espécie de Prozac dos tempos antigos.
Mas voltemo-nos para as suas capacidades culinárias que nos parecem mais interessantes.
O seu gosto ligeiramente semelhante ao pepino torna-a boa para uso em saladas e infusões de bebidas do tipo ponche.
Já falamos do uso das folhas, utilizadas como vegetal cozido.
Em alternativa utilizam-se cruas, devendo ter o cuidado de escolher as mais jovens e de as picar. Podem usar-se em saladas ou em molhos, como por exemplo nos molhos de iogurte ou adicionadas a queijos cremosos ou para fazer manteiga aromática.

Os italianos usam-na por exemplo para fazer risotto. Também o ravioli recheado com borragem é típico da região de Liguria. Toma o nome de pansotti, o que se deve não ao seu conteúdo mas à forma, que é triangular e não quadrada como nos outros raviolis.
Foto extraída de Trek Nature

A flor, que nas minha fotografias não mostra toda a sua beleza, razão porque tive que usar uma foto alheia, é boa para utilizar nas saladas e para aromatizar vinagres. No século XIX foi usada para cristalizar, tal como hoje ainda se faz com as violetas, servindo depois para decoração de bolos.
Um efeito surpresa é congelá-las em cubos e adicioná-las às bebidas na altura de servir.
Talvez a sua maior aplicação seja para adicionar às saladas verdes. Faz um efeito muito bonito e produz um gosto contrastante, uma vez que são uma das flores comestíveis.

Este tema estimulou-me a falar sobre outras flores comestíveis o que farei já no próximo post.
(1) Informação da minha amiga Adriana Teixeira, que eu já tinha esquecido e a quem eu devo este post, pelo seu gosto pela agricultura.