quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Uma colecção de caixas de pimentão


A propósito de uma lata de pimentão que adquiri, e que mostrarei mais tarde, procurei fábricas de produção de pimentão.
É uma assunto que me tem interessado nos últimos tempos e sobre o qual pouca informação tenho encontrado.
Na primeira metade do século XX tivemos várias fábricas de pimentão, sobretudo no Ribatejo.
Claro que a nossa produção nunca se comparou à dos espanhóis, até porque também o usamos menos na comida que os nossos vizinhos.
Não estou ainda preparada para lhes falar neste assunto e não se justifica agora falar na caixa que despoletou esta conversa.
Entretanto encontrei este vídeo de um coleccionador espanhol (Dariovig) de latas de pimentão, que achei muito interessante, e que espero que gostem.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Servicinho de luxo em louça

Antigamente os meninos depois do Natal juntavam-se e mostravam as suas prendas.
Penso que já não acontece isso. Em primeiro lugar os meninos já não vão para a rua brincar. Depois, o número de presentes que recebem é tão grande, que já não lhes atribuem o mesmo valor que nós atribuíamos.
Eram presentes especiais porque desejados durante muito tempo e raros.

Lembrei-me disso ao mexer nesta caixa que, por acaso, recebi pouco antes do Natal.
Não tem qualquer marca identificadora na caixa ou na base da louça.
Deve ser portuguesa e datar dos anos 40.
No interior tem um rótulo que diz: «Servicinho de luxo em louça».
Uma doçura que deve ter feito a alegria de uma menina, num Natal distante.

domingo, 26 de dezembro de 2010

Lebkuchen, um bolo típico do Natal alemão

O meu amigo Helmut antes de partir para a Alemanha, para passar o Natal, veio trazer-me umas caixinhas de um bolo típico alemão, chamado «Lebkuchen».

Abrevio a história do Lebkuchen, que data da Idade Média.
Inicialmente um doce conventual, passou a doce comercial constando a sua produção em regimes de ofícios no século XVII. Mas os primeiros registos deste tipo de doce são muito anteriores, variáveis com as cidades, normalmente situadas em rotas de especiarias.
O primeiro registo deste tipo de bolo de Nuremberga data de 1395. Refiro este porque é precisamente do tipo Nuremberga o bolo que lhes apresento. São uns bolos achatados, feitos com farinha, açúcar e ovos, com muitas especiarias como anis, canela, cardamomo, coentros, cravo, gengibre, noz-moscada, pimenta, a que se junta mel e nozes, avelãs ou amêndoas. São decorados com laranja ou limão cristalizados e cobertos com um glacé ligeiro.

A marca aqui apresentada Haeberlein-Metzger vai buscar as suas origens a um confeiteiro de pão de gengibre (lebkuchen), de nome Junkman, que iniciou a sua produção em 1492. Em 1864 Heinrich Haeberlein comprou a padaria e industrializou-a. Quanto a Metzger era já mencionado em 1586. Em 1920 associou-se à empresa Haeberlein. Ambas foram compradas em 1999 por Lambertz GmbH & Co KG, uma empresa de Aachen. Para quem já não se lembra, Aachen é aquela cidade que aprendemos no liceu, que se chamava Aix-la- Chapelle.

Agora que a história se complicou com estas aquisições, tão habituais nos tempos que correm, deixo-vos neste final de Natal, com mais um doce típico desta época. Devem ter todos ainda as mesas cheias com o resto de doces que se fazem, e se consomem, em excesso, nesta época. Ao menos este, como é um bolo virtual, não lhes faz mal. 

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

O Natal com Licor Natal

 
O meu poste natalício comemorativo deste ano é com o anúncio do «Licor Natal».
Em 5 de Setembro de 1932 entrava na Repartição da Propriedade Industrial um pedido da empresa “Salgado & Martins, Lda” para registo da marca «Ginjinha Popular». No ano seguinte, em 27 de Maio de 1933, era passado o Título de Registo do Nome de Ginjinha Popular, firma comercial portuguesa com sede na Rua Eugénio dos Santos, 61.
 
Ainda hoje lá existe o estabelecimento, onde no interior se pode ver um reclame publicitário à casa. Embora mantenha o nome foi transformada em café.
Durante anos a Ginjinha Popular vendeu, para além da ginjinha, vários licores, entre os quais o aqui apresentado «Licor Natal».
Nos anos 60 a casa «Ginjinha Popular» foi comprada pelos proprietários da vizinha «Manteigaria Londrina» e entregue em exploração a dois sócios. A sociedade não correu bem e, nos anos 70, já só restava um dos sócios de nome Adolfo. Foi nos anos 70 que aí foi admitido o sr. Alípio Ramos que me forneceu muitos dos dados que consegui apurar. Hoje é proprietário da Frutaria Bristol, sobre a qual falarei um dia destes.
O sr. Alípio recorda ainda a venda de capilé, groselha e salsaparrilha vendida ao balcão, à caneca, misturada com soda. Nessa altura já não existia o Licor Natal. Embora ainda se vendesse ginginha e outros licores, a produção já não era própria mas adquirida à firma José d’Oliveira Salgado, Lda, que ainda produz a Ginja Rubi.
Interior da Ginjinha Popular vendo-se um dos sócios actuais
 O Licor Natal ganhou um primeiro prémio para licores, isto é, uma Medalha de Ouro, cuja imagem ostentou depois na garrafa, numa exposição Industrial que teve lugar na FIL, em data que não sei precisar (finais dos anos 60?).
É provável que este licor tenha dado a ideia para a realização de um outro licor, neste caso de banana, vendido em garrafa de vidro pintada, com o feitio do Pai Natal. Foi comercializada pela firma Caldeira Ldª, de Lisboa e dela apresento este exemplar que tive a sorte de encontrar.
Um Feliz Natal para todos, mesmo sem Licor Natal

sábado, 18 de dezembro de 2010

Os Beijinhos, uns bolos que esquecemos


Recebi de presente um saquinho de “beijinhos”. Fiquei radiante porque há anos que não os via.
Se perguntarem aos mais novos já ninguém conhece uns bolinhos chamados «beijinhos». Experimentem e perguntem aos mesmos se conhecem os bolos americanos, agora vendidos em franschising, e que dão pelo nome de “cup cakes”. Todos conhecem e, se não é ainda o caso, vão conhecer ou vão querer comer. Não é que sejam a mesma coisa. De comum só têm a cobertura colorida, mas é esse o seu atractivo.

Os beijinhos são uns doces tradicionais feitos com uma base tipo pastilha, feita com massa idêntica à das línguas de gato e decoradas com um glacé colorido.

A diferença entre as línguas de gato e os beijinhos é que as primeiras são feitas com duas pastilhas que, ao cozerem no forno se juntam, dando a forma da língua, enquanto os beijinhos são feitos apenas com uma pastilha. Por outro lado as línguas de gato não recebem qualquer cobertura, enquanto os beijinhos são cobertos com um glacé colorido.

Há alguns anos atrás no dia de Todos os Santos, nas aldeias, os jovens iam pedir o «Santorinho» ou o «Pão por Deus». Levavam sacos de pano que iam enchendo com os presentes das pessoas que visitavam. Normalmente frutos secos, nozes, línguas de gato, beijinhos, etc.
Tudo isso se perdeu e em substituição importámos o Halloween.

Digam lá se não é a isto que se chama ser saloio.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

A dor de cabeça do cozinheiro

Falo do cozinheiro por razões óbvias. Mas podia falar na dor de cabeça do moleque ou da criada, da angina do médico, da gripe da varina, da dor de dentes do saloio ou do abatimento da senhora ou do juiz.

Estas são algumas das figuras que fazem parte do Jogo do Loto com figuras, oferecido pela Casa Bayer, nos anos 40-50.
Trata-se de material de publicidade a dois medicamentos: a “Panflavina” e a “Cafiaspirina”.

O jogo compõe-se de 6 cartões que permitem três pessoas jogarem. O banqueiro do loto baralha as fichas do jogo e e vai depois retirando-as de um saco.
É um loto como qualquer outro mas tem a particularidade de apresentar nos cartões as figuras abatidas, próprias de um estando de doença. Após a tomada do medicamento adequado, o que se consegue colocando a ficha no local próprio, surge-nos a mesma figura agora risonha e pronta a enfrentar a vida.
Uma publicidade ingénua, que nos faz sorrir, tão longe da actual.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

O Natal visto por Maria Keil

Há alguns anos atrás conheci Maria Keil. Não me lembro já como, nem aonde.
Aquela figura aparentemente frágil impressionou-me pela sua modéstia e simplicidade. Talvez tenha sido esta sua faceta que fez com que a sua obra não fosse tão valorizada como devia, apesar dos inúmeros apreciadores que surgem imediatamente quando se refere o seu nome.
Sempre admirei os seus trabalhos, muitos dos quais assinava de forma simples com a palavra «Maria», ou apenas «M».
A pureza e autenticidade do seu traço transportam-nos para um mundo maravilhoso. Tudo é aparentemente simples, mas rigoroso.
Nascida em 1914, tem tido um percurso importante como pintora, desenhadora, designer gráfica, ceramista, etc. Foi autora de desenhos para tapeçaria e para azulejos, de que se salientam os que podemos ver diariamente no Metro de Lisboa ou na Avenida Infante Santo.
Mas hoje, atendendo à época, fui buscar duas das suas obras em que retrata o Natal.

Da primeira apresento algumas ilustrações que fez para o livro de Sofia Mello Breyner Andersen, «A noite de Natal», publicado em 1959, pelas edições Ática.

Este último é um desenho que fez para o número de Natal da Revista «Eva» de 1942.
Uma garfada fora do prato, mas muito saborosa.

PS: A maior parte das ilustrações foram tiradas da exposição «Maria Keil. Ilustradora» que teve lugar em 2004 na Biblioteca Nacional.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

O Licor Beirão e a Fábrica Imperial

José Carranca Redondo (1921-2005), em entrevista dada ao Diário de Notícias, em 17 de Julho de 1998, referia-se à sua entrada na «Licor Beirão», em 1940.
Em todas as informações que são divulgadas sobre a firma repete-se a mesma afirmação.

Foi pois com surpresa que encontrei uma notícia sobre a «Fábrica Imperial e os Preciosos Licores da Lousã», publicada na Revista Turismo de Maio/Junho de 1942.
 O jornalista, não identificado, deslocou-se à Lousã onde visitou várias fábricas. Entre elas salientava-se a Fábrica Imperial, dirigida pelo então jovem proprietário e gerente José Carranca Redondo.

Conhecido era já o Licor Beirão, produto que segundo o redactor da notícia se encontrava em todos os cafés do país. Além deste, a fábrica produzia outras bebidas licorosas, como os “Ponches Iris”, “Montecarlo” e “Raquel”, que afirmava «têm merecido deste industrial o maior carinho», o mesmo se aplicando a todas as outras marcas da «Imperial».
O futuro viria a demonstrar que o carinho dedicado ao Licor Beirão foi realmente superior e que todas as campanhas publicitárias que este industrial veio a desenvolver se centraram nesta bebida. Todas as outras, bem como a Fábrica Imperial, ficaram esquecidas.
Esta era uma pedra perdida no puzzle que constitui a história de um dos nossos mais míticos licores e que eu não podia deixar de partilhar.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Cartazes Publicitários: O Rei do Bacalhau

Inicio hoje uma rubrica sobre cartazes publicitários, relacionados com alimentação ou bebidas e  que se encontram ainda dispersos pelo país.

Começo com o «Rei do Bacalhau», loja situada na Rua do Arsenal, em Lisboa.
Muito própria para a época natalícia.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

O Bolo Paris-Brest

No post anterior falei no quiosque que, no final do século XIX e início do século XX, existia em Lisboa, na Gare do Rossio, chamado "Bureax de la Presse".
No final do século XIX as elegantes lisboetas não dispensavam a leitura das principais revistas de moda francesas, como atestam os numerosos exemplares que até nós chegaram.
O proprietário do referido quiosque do Rossio era o importador e vendedor das seguintes revistas: La Mode Nationale, Mode du Petit Journal, Le Petit Echo de la Mode, La Famille, Mode du Journal, La Saison, etc.
Um dos mais famosos Le Petit Journal, foi um jornal parisiense publicado entre 1863 e 1944, que atingiu uma divulgação importante. Foi Pierre Guiffard (1853-1922), um seu jornalista e apaixonado pelo ciclismo que, em 1891, iniciou a célebre corrida de bicicletas Paris-Brest-Paris. A corrida inicial chegou a ter 1200 Km e a sua fama foi tal que as vendas do jornal impulsionador da ideia aumentaram em exponencial.
Este evento criou também uma moda no uso da bicicleta, fomentada pela publicidade de alta qualidade, em que se encontravam nomes como o de Alphonse Mucha.
E apesar de na corrida não serem aceite elementos do sexo feminino foi a imagem das mulheres quem mais povoou o universo publicitário que rodeava o ciclismo.
Embora inicialmente tenha sido feito um bolo em forma de coroa de louros, não reza hoje dele a história. Foi só em 1910 que, em homenagem a esta corrida, foi criado, por Louis Durand, o não menos célebre bolo Paris-Brest. Feito em “pate à choux”, de forma circular, a lembrar uma roda de bicicleta, é recheado por creme mousseline, com praliné e decorado com amêndoas lascadas e açúcar em pó. Este bolo, apesar de francês, internacionalizou-se e mantém hoje o mesmo sucesso que alcançou na data de origem.
Embora esta seja a história que se conta, sempre achei que a forma circular representava o circulo fechado que traduzia uma corrida, em que se partia de um ponto, em corrida, para no final chegar ao mesmo local.
Para mim, Paris-Brest, significa o absurdo.

sábado, 27 de novembro de 2010

Os livros «A Cosinha das Familias» e «A Cozinha das Famílias»

 Comprei hoje um livro de culinária de 1897, com o título «A Cosinha das familias». O título parecia-me familiar, mas não reconheci o frontispício, o que me levou a adquiri-lo. Na realidade existem vários títulos semelhantes, em português e em francês. Em França foram publicados vários «La cuisine de famille», tanto em folhetos como em livro. Um grande sucesso foi também «La veritable cuisine de famille» de Tante Marie, que teve imensas edições no início do século XX.
Ao chegar a casa constatei que efectivamente tinha um livro «A Cozinha das Familas» (cozinha com z). Este livro, igualmente sem autor, foi editado por Manuel Lucas Torres, que era filho de Lucas Evangelista Torres, tipógrafo e mais tarde escritor e editor. Manuel Lucas Torres foi editor, tal como os seus irmãos João Romano Torres e Fernando Augusto Torres. Foi ele quem continuou a obra de seu pai mantendo a publicação da “Encyclopédia das Famílias”, por este iniciada.
 Na “Encyclopedia para todos” publicou o primeiro número, em 1908, intitulado «Guerra Peninsular», da autoria de Pinheiro Chagas, que já havia colaborado com seu pai, um segundo número que não consegui identificar (*) e o terceiro número desta série intitulava-se «A cozinha das Famílias». Foi publicado pela 1º vez em 1913 e reeditado em 1918, a acreditar na data registada para o mesmo título, existente na Biblioteca Nacional.
Tratava-se portante de um livro completamente diferente deste, de que não encontrei até ao momento qualquer referência, inclusivamente na Biblioteca Nacional e no «Livros portugueses de cozinha».

A autoria do livro não está identificada excepto pela frase:«Collaborada pelos melhores cozinheiros de diversos países e gastrónomos de nomeada». 
Também o editor não está identificado mas compreende-se, após a leitura das receitas, que se trata de um livro de autoria portuguesa, com influência francesa nas receitas e alguma orientação para o mercado brasileiro.
A origem portuguesa é-nos dada pelas várias receitas com nomes de portugueses ilustres à época, que dão nome a várias receitas como: a potagem à  Magalhães Lima, à Silva Graça, à Serpa Pinto, à Bordallo Pinheiro, o molho à João Franco, o molho à João Chagas, os restos de carneiro à Neves Ferreira ou o coelho á Taborda. Até receitas de Domingos Rodrigues, o nosso autor da «Arte de Cozinha», do século XVII, estão presentes, como a galinha de alfitete, a galinha sem osso e a galinha em pé, além de duas receitas de pombos: pombos dourados e pombos de D. Fernando.
Há também uma menção ao mercado da Figueira onde se aconselha a ir comprar alhos franceses, para aqueles que ainda os não conhecem, para fazer uma potagem.

Quase todas as receitas têm o seu nome traduzido para o francês. Muitas são receitas de cozinha francesa clássica. Outras, em menor número, são de cozinha internacional e não posso deixar de mencionar uma curiosa “Potagem à Karl Marx”.

Esta obra não se destinava apenas ao mercado português, mas também ao brasileiro. Vejamos esta última afirmação. O livro logo no frontispício identifica-se como uma «obra destinada a todas as famílias de Portugal e do Brasil». E logo após a “Advertencia” inicial, apresenta um quadro em que se declara que todos os direitos de propriedade da obra «nos Estados Unidos do Brasil» pertencem ao Sr. Dr. António Candido A. do Largo, cidadão brasileiro, residente no Rio de Janeiro. Analisando as várias receitas conseguimos identificar algumas com essa proveniêncai como o Quitute de fígado de porco á moda do Brasil, a conserva de porco fresco à brasileira, os bifes de fígado de porco (receita brasileira), o leitão à brasileira, as linguiças à brasileira, o vatapá de porco á baiana e o  coelho à baiana.

Não estando referido o editor é no entanto nomeado o depositário do editor que era o «Bureax de la Presse», em Lisboa. A publicidade no final do livro informa-nos que se tratava de um quiosque existente na Gare do Rossio, pertença de Guilherme Melchiades, que recebia encomendas para toiletes, chapéus, luvarias e todos os artigos de toilete precisos às “elegantes das províncias e ilhas”.
Era também o vendedor das principais revistas de moda francesas como La Mode Nationale, Mode du Petit Journal, Le Petit Echo de la Mode, La Famille, La Saison, etc.

Destes dados constata-se portanto que se trata de duas obras completamente diferentes.
A Cosinha das Famílias não só é mais precoce do que A Cozinha da Famílias, como também é mais rara.
É sempre um prazer descobrir um destes livros. Dá-los a conhecer é uma obrigação.

(*) Poderá corresponder ao Nº 2 da “Encyclopedia da Infancia”, intitulado «Jogos Infantis» e mencionado por Augusto Pires de Lima na sua obra «Jogos e Cantos Infantis»?.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Objecto Mistério Nº 20. Resposta: "Penny lick"


Em relação à primeira pergunta, qual o nome do objecto mistério Nº 20, vejo-me obrigada a responder em inglês, por desconhecer se existe um nome próprio em português. Trata-se de um «Penny lick». Em português tenho que traduzir simplesmente para «copo para gelado» e, com esta afirmação, já respondi à segunda pergunta.
Este tipo de copo foi usado em Inglaterra, durante o século XIX, pelos vendedores ambulantes para vendiam gelado nas ruas. Existiam três tamanhos para além do apresentado: um menor o «halfpenny lick» e um maior «duplo penny lick». Como a palavra “lick” indica, estes gelados eram lambidos e não comidos com colher.
O vidro grosseiro e espesso permitia apresentar um copo em que as paredes exteriores não reflectiam o diminuto conteúdo. A bola de gelado colocada na pequena cavidade era reflectida pelo vidro que aumentava, de forma enganadora, o seu tamanho.

A este tipo de copos chamam os ingleses “deceptive glass”, o que se pode traduzir por “copos enganadores”.
No caso dos gelados, permitiam ao vendedor economizar no produto que vendia.

E o mesmo se passava nas tabernas, local em que, em Portugal, foram sobretudo usados. Existiram vários modelos de que apresento alguns exemplos que possuo.
O vidro espesso que caracteriza este tipo de copos não se destinava apenas a diminuir a possibilidade de quebra do vidro, tanto mais arriscada quanto se reduz a sua espessura. Tinha por fim enganar os clientes e servir uma menor quantidade do que este pensava estar a ingerir.
Nalguns casos havia quem considerasse uma vantagem o seu uso social. Um anfitrião podia acompanhar os seus convivas, bebendo por um copo deste tipo, o que lhe permitia manter maior sobriedade ao mesmo tempo que parecia acompanhar os seus companheiros.
Também são conhecidos por “copos de chefes de cerimónia”. Existe no Museu Albert and Victoria, em Londres, um exemplar destes, do século XVIII. Foi usado com esse fim, isto é, permitir ao chefe de cerimónias fazer saúdes com o seu copo enganador e manter a compostura e sobriedade que a função lhe exigia.  São contudo muito raros, uma vez que a grande maioria deste tipo de copos são do século XIX.
No séculos XVIII e XIX aplicavam-se assim conhecimentos empíricos, que mais tarde viriam a ser estudados, sobre a forma como o feitio de um copo influência o seu consumo. Não é por acaso que as “flutes” de champanhe vieram substituir as taças de champanhe de copa larga que se usaram até há pouco mais de uma década. É que com as novas flutes se bebe menos champanhe.
A mente humana tem tendência a ver nos copos altos e estreitos menos quantidade quando comparados com copos baixos, ainda que largos.  Foi isto que um estudo feito por Brian Wansink, professor americano na Universidade de Cornell, e investigador sobre os hábitos de consumo e em ciência nutricional descobriu, publicou no British Medical Journal (1): qualquer pessoa tem tendência a deitar maior quantidade de bebida num copo pequeno do que num copo alto.
Para terminar gostaria de dizer que este tipo de copo semelhante ao “penny lick” apresentado existiu também em Portugal. A prová-lo este exemplar que me foi oferecido por um amigo. Era usado em casa do anterior proprietário para pregar partidas às visitas, quando ofereciam licores ou outras bebidas alcoólicas. Encontrei um modelo semelhante no «Catálogo elaborado em 1901 pertencente à Companhia da Nacional e Nova Fábrica de Vidros» (2). Tem o nº 10 e é descrito como «cálice grosso para licor». Nesse ponto ficamos esclarecidos. Mas como o copo data do século XIX não sei se terá tido outro uso anteriormente. O que quero dizer com isto é que desconheço se foi usado para gelado.
Bibliografia:
1 - Brian Wansink and Koert van Ittersum, "Shape of Glass and Amount of Alcohol Poured: Comparative Study of Effect of Practice and Concentration”, British Medical Journal, 2005, 331:7531
2 - Real Fábrica de Vidros da Marinha Grande. II centenário 1769-1969. Quadros LV e LVI.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Objecto Mistério Nº 20

O objecto de hoje dá direito a duas perguntas:

1 - Como se chama este copo?

2 - Para que servia?

Ajudas:

Tem de altura 6,5 cm e a largura do bucal é de 4,5 cm.
Como podem ver é de vidro grosso.

Aceitam-se sugestões.

domingo, 14 de novembro de 2010

O livro «Manual de Confeitaria»

 O meu amigo Júlio Carreira, da Arquimedes Livros, teve a amabilidade de me oferecer um livro que ele próprio reeditou. Trata-se do «Manual de Confeitaria» de Candido Borges da Silva.
Teve a sorte, como livreiro, de encontrar o raro original que não é mesmo descrito pelos historiadores brasileiros. Apercebendo-se da sua raridade decidiu fazer uma reedição de apenas 80 exemplares, de que sou agora uma das felizes possuidoras.
O livro, publicado no Brasil em 1866, foi feito em Paris na Livraria da Viúva J. P. Aillaud, Guillard e Cia e apresenta na folha de rosto o brasão de Portugal e do Brasil.
Este livro vem assim tomar o segundo lugar dos livros de doces brasileiros.
O primeiro intitula-se a “Doceira brasileira ou nova guia manual para se fazerem todas as espécies de doces”. Foi publicado pela 1º vez em 1851. A 2ª edição data de 1856 e foi publicada o Rio de Janeiro, por Eduardo Henrique Laemmert. Foram feitas 6 edições entre 1851 e 1890. A sua autora foi D. Constança Olívia de Lima. Os editores já haviam publicado também o primeiro livro de culinária brasileiro o “Cozinheiro imperial”.

Passa, com esta descoberta, o livro “O Doceiro Nacional”, de autor desconhecido, publicado em Paris, sendo o impressor Paul Dupont, em 1883, a ser o terceiro livro de doçaria brasileiro a ver a luz do dia. Foi a Livraria Garnier do Rio de Janeiro quem publicou este livro, a mesma que publicou muitos dos livros de Machado de Assis.
Isso talvez explique a afirmação de Machado de Assis (1839-1908), ao comentar a importância do lançamento de um livro de confeitaria, o que demonstrava as novas alterações introduzias no quotidiano brasileiro do século XIX. São dele as seguintes palavras: «É fora de dúvida que a literatura confeitológica sentia necessidade de mais um livro em que fossem compendiadas as novíssimas fórmulas inventadas pelo engenho humano para o fim de adoçar as amarguras deste vale de lágrimas (...). No meio dos graves problemas sociais, cuja solução buscam os espíritos investigadores do nosso século, a publicação de um manual de confeitaria só pode parecer vulgar a espíritos vulgares; na realidade, é um fenómeno eminentemente significativo.». A citação é de Gilberto Freire em ”Açúcar”.

Estranhamos contudo o tardio deste tipo de publicação, já em meados do século XIX. Em Portugal havia já sido publicado o «Arte Nova e Curiosa para Conserveiros, Confeiteiros e Copeiros», em Lisboa, saída da Oficina de José de Aquino Bulhões, em 1788, que é um livro exclusivo de confeitaria.
À excepção do livro de Nostradamus (1503-1566), mais conhecido pelas suas profecias, que escreveu o “Traite des fardemens et des confitures”, em 1555, todos os restantes são mais tardios. Foi realmente um precursor neste campo, o que se atribui ao facto de ter sido farmacêutico, pessoa que então era o vendedor do açúcar.
Nos primeiros livros de receitas e mesmo mais tarde, os autores incluíam as receitas de doçaria nos livros de culinária. Foi no século XVIII que surgiram os primeiros livros apenas dedicados à confeitaria.
Um dos mais famosos foi o livro francês “Le Cannameliste Français”, escrito em 1751, por Gilliers, o cozinheiro-pasteleiro do rei da Polónia. Nesse livro o autor refere tudo o que era necessário conhecer para o bom exercício da profissão, bem como os utensílios necessário na copa. O nome refere-se a “Canamelle” antigo nome da cana de açúcar e por conseguinte aplicado ao que trabalhava o açúcar.
O «Manual de Confeitaria», de Candido Borges da Silva, segue essa linha e começa por uma 1ª secção em que descreve «as partes constituintes de uma oficina de Confeitaria». Esse aspecto é tanto mais interessante quanto sabemos que a própria arquitectura se modificou, durante o século XVIII, de modo a integrar um maior número de dependências destinadas ao «office», isto é, aquilo que nós designávamos abreviadamente por «copa». Mas este é um outro mundo.