terça-feira, 21 de julho de 2020

Para desenjoar


Foi a beleza das imagens de uma pequena caixa de comprimidos que me atraiu. É uma amostra para ensaio clínico que era oferecida aos médicos. Quando um medicamento novo saía eram oferecidas algumas caixas aos médicos para darem aos doentes, permitindo-lhes ficar com informação directa sobre o seu efeito. Há alguns anos isso foi proibido, o que não me apetece comentar.

Este medicamento, o dimenidrinato, tem uma longa história e ainda hoje é utilizado. Criado em 1947 por 2 investigadores do Johns Hopkins Hospital, Lesley Gay e Paul Garliner, revelou-se logo eficaz como anti-emético. Antes porém de comunicarem a sua investigação fizeram um estudo, em 1948, no final da II Guerra Mundial, em colaboração com a Marinha americana, nos marinheiros do navio US Navy. A chamada «Operação enjoo» abrangeu 1376 soldados americanos divididos em dois grupos. Os que tomaram o medicamento não enjoaram na longa viagem de Baltimore para Bremerhaven, na Alemanha.
Confirmada a sua eficácia os autores publicaram os resultados e a partir de 1949 o produto era comercializado.
Não sei dizer quando foi introduzido em Portugal porque o seu registo foi muito tardio. Foi comercializado pelo Instituto Luso-Farmaco, que foi constituído em 1948 por António Diogo Bravo e Miguel Cocco. Na embalagem vem identificado como único depositário: Paulo Cocco, Lda.

Em 1964 era construído um novo edifício da autoria de Carlos Tojal e Carlos Roxo, na Rua do Quelhas, 8, em Lisboa. O edifício moderno e luminoso apresentava painéis de azulejos da autoria de Sã Nogueira alusivos a temas farmacológicos. Guardo dessa local boas recordações do meu tempo de jovem médica.
Painel de azulejo exteior de Sá Nogueira. Foto do  site SOS Azulejos 
Possuía um “Centro de Documentação” que era o melhor de Lisboa. Nenhuma Universidade, Hospital ou Laboratório se lhe comparava. Eu ia lá regularmente consultar as revistas médicas que recebiam e fazer fotocópias. Foi aí que aprendi, com uma Bibliotecária muito eficiente de que já não recordo o nome, o que era uma “Keyword” e a importância da catalogação. Num pequeno caderninho, que ainda possuo, ia registando as minhas leituras.
Foto da internet (wikimedia)
Hoje o edifício foi transformado em bloco de apartamentos, a empresa já não existe mas, extraordinariamente, o medicamento ainda é comercializado, com o nome de Enjomim e de Vomidrine.

Quanto ao autor dos alusivos desenhos da embalagem, ignoro quem tenha sido. Infelizmente apenas se encontra representado o enjoo por mar e por avião. Indicado para todos os enjoos ficou-nos a faltar os enjoos terrestres, como diz na bula. Devia ser igualmente interessante.

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