quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Os Caldos Maggi em Cubo

Decerto ficarão surpreendidos por saber que os caldos Maggi começaram a ser fabricados no início do século XX. Refiro-me aos caldos de carne concentrados, em cubos, porque as sopas em pó começaram a ser produzidas ainda no final do século XIX. Surgiram como uma necessidade criada pela industrialização na Europa, com a saída das mulheres para as fábricas e, consequentemente, menos tempo para o trabalho doméstico.
Foi um suíço, Julius Michael Johannes Maggi (1846-1912), filho de moleiro e habituado a ver moer cereais que trabalhou numa fórmula para tornar estes mais saborosos, o que veio a conseguiu em 1863 e que se considera como sendo o início da marca Maggi.
Dr. Schuler, um médico suíço, que era também inspector fabril, apercebeu-se das condições de vida das trabalhadoras e de como a sua actividade afectava a alimentação das famílias. Foi ele quem alertou o governo suíço para este problema e sugeriu que fosse proposto a Julius Maggi a criação de um produto vegetal nutritivo que fossem fácil de confeccionar. Em 1885 nasciam as sopas instantâneas, produzidas em grande escala, sendo as primeiras as de ervilha e as de feijão.
Em 1886 Maggi & Cª começou a produzir molhos e, no início do século XX, os célebres caldos em cubos. É sobre estes que queremos falar.
Em primeiro lugar quero salientar, se tudo isto nos parece muito moderno, o que dizer dos caldos de carne já propostos por Vincente la Chapelle, na obra Le Cuisinier Moderne, em 1736, e que em Portugal foram também apresentados sob forma de receita no livro O Cozinheiro Moderno ou Nova Arte de Cozinha de Lucas Rigaud, publicado em 1780, com o título:

«Caldo em pastilhas, ou conserva para se transportar, ou por mar, ou por terra a países desertos em jornadas dilatadas; para Comandantes de Exércitos, Governadores de Praças Sitiadas, Cidades aflitas de peste; e outros acidentes, que podem sobrevir, e em que por nenhum dinheiro se pode encontrar, nem galinha, nem carne».

Mas avancemos um século para falar novamente nos cubos Maggi. Logo nos finais de 1888 a Maggi começou a abrir armazéns nas principais capitais europeias, como em Paris, em Berlim, Viena e Londres.
Em 1908, quando surgiu em França o caldo concentrado de carne em cubo foi chamado «KUB».
Olhado inicialmente com desconfiança pelas donas de casa, foi sendo aceite por substituir de forma mais económica a carne. Para isso foram necessárias grandes campanhas publicitárias. E nem os grandes nomes da culinária foram esquecidos para recomendar a sua utilização.
Em Paris Maggi contactou Escoffier para divulgar o seu caldo KUB nas cozinhas comercias. Mas as donas de casa ficavam também abrangidas quando, no seu livro «Le Guide de la bonne Cuisinière», Escoffier declarou:

«Na minha longa carreira de chefe de cozinha pude examinar vários produtos de extractos de carne, utilizados para economizar o tempo de preparação dos alimentos, realçando as suas qualidades saborosas. Posso atestar que os caldos Kub se podem colocar em primeiro lugar».

De forma subtil Escoffier fazia uma comparação com outras marcas que posteriormente tinham aparecido, como a marca alemã de caldos OXO, o Viandox lançado em França pela firma Liebig e a marca Knorr, igualmente alemã.
O grafismo simples de KUB agradava às pessoas e até Picasso foi sensível à sua imagem quando o incluíu num dos seus quadros «Paisagem com cartazes», de 1912, levantando celeuma nos críticos sobre se a sua intenção seria usar uma alegoria à palavra CUBismo ou outra. Alguns chegaram a considerar este quadro como um precursor da Pop-art, antecendento em muitas décadas o trabalho de Andy Wharhol ao usar as latas de sopa Campbell's nos seus quadros.

Não encontrei em Portugal qualquer registo dos caldos Maggi antes da aquisição desta pela Nestlé em 1947. Os caldos em cubo eram no entanto já vendidos pelo seus concessionários em Portugal, a firma Alves & Cª, situada na Rua dos Correiros, nº 41-2º, em Lisboa. Este empresa existia desde 1916 tendo sido fundada pelos irmãos José Bernardo Alves, que era farmacêutico e António Bernardo Alves, guarda-livros e dedicavam-se à actividade de representações estrangeiras.

Mais tarde associaram-se os irmãos Eugénio Bernardo e Joana Maria e passaram a denominar-se Alves e Cª (Irmãos). É interessante que tenha sido também esta firma a representar uma outra empresa suíça, a sociedade Wander, que eram os fabricantes do “Ovomaltine”.
Em 1947 já a representação dos caldos Maggi tinha passada para a Sociedade de Produtos Lácteos, como se pode constatar pelo carimbo aposto sobre a antiga morada, no folheto de 1947, que justificou este poste.
Esta empresa foi fundada em 1923 pelo médico Professor Egas Moniz, que impulsionou a industria leiteira em Portugal e fundou a  primeira fábrica de leite em pó, em Avanca. A fábrica começou a laborar em 1924. Posteriormente a Nestlé e a Anglo Swiss Condensed Milk Cº que já haviam confiado, em 1933, a licença para produção dos seus produtos lácteos à Sociedade de Produtos Lácteos, cuja sede ficava situada na Rua Sociedade Farmacêutica 2, em Lisboa, passou também para essa firma a representação da Maggi. Em 1934 esta firma foi adquirida pela Nestlé.
Os mais novos já não conheceram estes cubos, mas eu recordo-me ainda em pequenina destes em casa da minha tia Olinda, em Lisboa, onde vinha passar férias. Este folheto despertou a minha memória. Ontem, se me perguntassem, diria que estes cubos nunca existiram em Portugal.

5 comentários:

Anónimo disse...

Muito bem!

Que texto tão escorreito e engraçado.

Beijos e mtobrigado

Anónimo disse...

Oh Ana
faz desaparecer as insidiosas letrinhas
que impedem os comentários
a cavalo numa falsa mensagem de segurança.

('inda por cima são de péssima leitura)

(Estou Signed In no Google e o meu coment continua a ser atribuído a um 'anónimo')

(isto 'trabalha' mal...)


Ana Marques Pereira disse...

Anónimo,
Consegui finalmente perceber que as mensagens iam para spam. A partir de agora se não aparecerem já sei onde estão. Obrigado pelo comentário. Bj

Fernando Dionisio disse...

Ana Marques, tenho uma lata de cubos maggi portuguesa datada de 1911,forrada a papel.
Cumps
Dionisio

Ana Marques Pereira disse...

Fernando Dionísio,
Gostava de a ver. Não me quer enviar uma foto?
Obrigada. Cumprimentos