segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Os nogados

O meu amigo Nuno já me tinha prometido trazer nogado do Alentejo. Este veio de Estremoz mas é feito noutros locais desta província e também no Algarve e nos Açores pelo Natal. É localmente designado “Nogados” tal como no espanhol “Nuégados”.
É um doce antigo e o Dicionário da Academia Espanhola defini-o como uma massa cozida no forno, feita com farinha, mel e noz, mas que pode também ser feita com pinhões, amêndoas, avelãs e sementes de cânhamo. É curioso porque estas últimas, que são as sementes da Cannabis sativa, eram usadas pelo seu gosto a noz e hoje voltam a sê-lo por serem consideradas uma das sementes que estão na moda, incluídas na designação absurda e inadequada de “superalimento”.
Sementes de cânhamo. Foto tirada do site Sociedadevegan.com
Mas a receita usada em Espanha é diferente da alentejana porque neste caso leva farinha e a massa é feita em pequenos rolinhos que são cortados e fritos e que só depois são introduzidos na calda de mel e açúcar.

Muito diferente como se pode constatar do que consideramos o verdadeiro nogado. Este é um doce elaborado com mel, açúcar caramelizado e amêndoas, nozes ou avelãs e a etimologia vem do francês nougat. Em França já há referência ao “nogas” em livros de Medicina do século XVI como na Paraphrase sur la Pharmacopoee (1595) e no Brief Traicté de la pharmacie provinciale et familiere (1597).
Nos dicionários franceses encontramo-lo pela primeira vez no Dictionnaire de L'Académie française, (1762), na sua 4ª edição, que o define como uma espécie de bolo feito de amêndoas ou de nozes com caramelo. E diz que não tem plural.
Nougat. Fotografia tirada da internet.
Quanto ao Padre Rafael Bluteau, cujo dicionário foi publicado ente 1712 e 1723, não o refere como doce e menciona um autor espanhol que designa nogado como um molho feito com nozes.
Conclusão: Da próxima vez que comer um nogado pense que nada é simples na vida. Nem a definição de nogado.
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P.S. Apenas uma pequena parte disto encontra-se definida no livro «Do comer e do Falar…» que vai ser lançado amanhã. Mas depois de comer este doce não resisti em desenvolver o tema, embora fique ainda muito por dizer.

6 comentários:

José Daniel Ferreira disse...

Fica sempre muito muito para dizer. Esse livro, juntamente com o de Virgilio Gomes, são fundamentais em qualquer biblioteca.
Seja como for, para o Bento da Maia, Nogado é do Algarve: http://asreceitasdaavohelena.blogspot.pt/2013/11/nogado-do-algarve.html

Ana Marques Pereira disse...

José Daniel Ferreira,
Isto das origens é sempre muito difícil de precisar, em especial num doce que leva mel e frutos secos que são os mais primitivos. Fui ver o Bento da Maia (culpa sua) e ele fala em Nogado do Algarve (com amêndoa), do Alentejo (com farinha, como este), verde (feito com nozes verdes) e até um à Transmontana, que eu desconhecia, com nozes pisadas com casca (o que pressupõe que são verdes também), ovos e rosquilha.
Um abraço

Helena Sacadura Cabral disse...

Ana
Sou metade alentejana. A outra metade beirã.
Em Vila Viçosa fazia-se um nogado em rebolo com mel, nozes e umas bolinhas de uma massa muito leve.
Mas sempre considerei a receita como oriunda do Alentejo.
Bjo

Helena Sacadura Cabral disse...

Errata "nogado em rolo"

Ana Marques Pereira disse...

Helena,
Obrigada pelas suas memórias. Ontem andei à procura do significado de rebolo, que também quer dizer cilindro, e que fazia sentido porque os nogados alentejanos são feitos primeiro em rolinhos que são cortados, embora também já tenha visto em bolas.
Ia confessar a minha ignorancia e estava a pensar que me faltava mais este vocábulo no Vocabulário do «Comer e do falar», mas agora já estou mais descansada. Obrigada. Um bj

Rita Ortiz-Gião disse...

Como informação adicional:
O Nógado é um bolo que teve a sua origem no Real Convento das Servas em Borba. Além da forma tradicional também pode ser enrolado como um chouriço tipo salame que depois de frio se corta em fatias com 1 cm de espessura(nalgumas zonas do Alentejo ao Nógado assim apresentado dá-se o nome de Mexericos).
Os Nógados do Alentejo são feitos de massa frita ao contrário dos de Trás-os-Montes que são feitos com nozes e os do Algarve que são feitos com amêndoas.