segunda-feira, 29 de julho de 2019

O Hotel Alexandria em Menton

Ao folhear um exemplar da revista La Constrution Moderne de 1885 deparei-me com a planta de um hotel de grandes dimensões em Menton. O livro apresentava apenas as gravuras com legendas. Na apresentação do edifício era designado como «Hotel de Voyageurs à Menton», mas seria mais tarde conhecido como Hotel Alexandra.
Nunca tinha ouvido falar de Menton e, no entanto, é uma cidade muito antiga, situada nos Alpes Marítimos e cuja topografia em anfiteatro do mar às montanhas a transformou num procurada colónia balnear. Esteve primeira ligada a Itália, depois ao principado do Mónaco até 1848 e passou para a posse da França em 1860.
Planta do subsolo onde se encontrvam as cozinhas
Entrou na moda como estância de veraneio no século XIX com a chegada de viajantes ingleses e russos à Côte d’Azur. Serviu de encontro de príncipes e viajantes endinheirados que aproveitavam passar o Inverno junto ao mar em grandes hotéis de luxo como o "Winter Palace", o "Riviera Palace" e claro este Hotel Alexandra. 
Planta do rés-do-chão onde se situava a sala de jantar
São construídos os primeiros hotéis “à inglesa” em Nice e Menton, de inspiração oriental, por influência colonial, rodeados por jardins que acolhiam os viajantes, sobretudos vindos do outro lado da Mancha, inicialmente (na segunda metade do século XVIII) para fazer o Grand Tour, as viagens em Itália. Com a chegada do comboio á região no século XIX começaram a instalar-se e modificaram a vida local.
Planta do 1º piso com o jardim de Inverno
Menton deve muito do seu desenvolvimento a um médico inglês James Henry Bennett que aí chegou em 1859 para se tratar de tuberculose. Tendo tido sucesso publicou dois livros sobre o tema: Sur le traitement des maladies pulmonaires, par l’hygiène, le climat, et la médecine, et ses rapports avec les doctrines modernes e L’hiver et le printemps sur les côtes de la Méditerranée.
Corte do Jardim de Inverno
Estas obra, traduzidas em várias línguas, levaram a que o número de residentes tenha aumentado consideravelmente o mesmo acontecendo com as instalações hoteleiras. E, se em 1861 a pequena vila não tinha mais de 2 ou 3 hotéis em 1875 passava para 30.

O Hotel Alexandra foi inaugurado em 1884 de acordo com um projecto do arquitecto parisiense Gustave Rives, que rompeu com as tradições do hotel maciço. Embora de grande dimensões apresenta recortes em que sobressaem as áreas sociais. 
No subsolo situavam-se as grandes cozinhas e áreas de serviço como era moda no século XIX, todas as dependências possuindo janelas. 
A sal de jantar
No rés-do-chão ficava a grande sala de jantar, precisamente sobre a cozinha, uma pequena sala de refeições, os salões, a sala de bilhar, a sala de leitura, etc. Era aqui que tinha início o jardim de Inverno que se estendia para o piso superior. Nos andares superiores ficavam os quartos.
Um dos salões
Foi o jardim de Inverno que me fez começar a escrever este poste. Esta forma de interiorização da Natureza, tão ao gosto oitocentista, servia também para tomar refeições nalgumas situações e habitações.
Jantar em Casa da Princesa Matilde
Sobre este tema recordo a bela pintura de Charles Giraud o jantar em casa da Princesa Matilde Bonaparte, onde a refeição teve lugar num jardim de Inverno e sobre o qual tanto há a dizer.
Jardim de Inverno do Hotel Krasnapolsky
E agora que se aproximam as férias recordo o Jardim de Inverno do Hotel Krasnapolsky, em Amesterdão, onde eu comi o melhor pequeno-almoço de que me lembro. Não terá sido influência do espaço?

Bibliografia:
Bottaro, Alain. La villégiature anglaise et l’invention de la Côte d’Azur. Consulta em linha em: http://journals.openedition.org/insitu/11060
Planat, P. (Director). La Construction Moderne. 24 de Outubro de 1885

sexta-feira, 19 de julho de 2019

Regresso à infância


Por três dias regressei à minha terra para investigar um tema para o meu próximo livro. Instalei-me em casa da minha amiga Cilinha que me deu todo o apoio logístico.
Durante três dias fomos recordando as nossas histórias, algumas já meio esquecidas, muitas com graça, outras não tanto, dependendo de quem as ouve. De uma recordação comum, que eu gosto de contar, a Cilinha dizia-me: «Outra vez essa história!», com um tom de quem já não a quer ouvir e eu tinha que abreviar. 

Passeávamos pelas ruas da Covilhã e identificávamos casas e dizíamos: «Lembraste? Aqui vivia fulana tal, nossa amiga». Lembrávamos o primeiro nome e o apelido já nos ia esquecendo. Na época em que estudávamos no Liceu, o nosso era um mundo feminino. Nos primeiros anos as turmas não eram mistas e o recreio das meninas era separado dos rapazes. À hora de entrada, no velho Liceu Heitor Pinto, os rapazes encostavam-se às paredes, ou à porta do café e ficavam a conversar e a ver a entrada das meninas.
Tínhamos os nossos percursos e as nossas pastelarias de eleição, e claro, os nossos bolos preferidos, alguns dos quais nunca mais souberam ao mesmo. Lembro-me de ir com a Cilinha a casa de uma senhora que vivia ao fundo das Escadas do Quebra Costas comprar pequenos biscoitos caseiros que ela fazia. Tentamos lembra-nos dos nomes, mas já desapareceram da nossa memória e da memória dos covilhanenses.
Recordei alguns dos antigos comeres: os pastéis de molho, pois claro, que a minha amiga já tinha comprado e as deliciosas cerejas da Cova da Beira. Trouxe comigo os Biscoitos de Azeite, diferentes dos do Fundão, onde também os fazem. Ainda tão suavemente deliciosos que rapidamente chegaram ao fim e as saudades fazem-me querer repetir a receita aqui em casa. Vamos ver se não sou preguiçosa e se saem tão bem.
Biscoitos de Azeite da Covilhã
À medida que envelhecemos os amigos de infância vão sendo cada vez menos. E aqueles com que continuamos a identificar-nos menos ainda. Por isso são uma pérola preciosa. Alguém que apesar das rabugices inevitáveis nos transmite um prazer imenso, uma sensação de calor agradável trazida pelas recordações da nossa meninice. Quando em comum existe um gosto pela estética infantil, que soubemos manter e que rodeia o nosso dia-a-dia, tudo fica mais fácil.
Obrigada Cilinha por continuares a ser a menina que conheci no início da minha adolescência.
Relógio de cozinha, obra da Cilinha e um santinho da açúcar das feiras


segunda-feira, 8 de julho de 2019

Museu Virtual: Caneca enganadora

Nome do Objecto: Caneca

Descrição: Caneca de forma cilíndrica com uma asa. Tem 9 cm de altura e 7,5 cm de diâmetro. Apresenta-se decorada com 3 riscas grossas de cor azul e 3 finas em manganês. Tem um segundo fundo falso, alteado, a cerca de 3 cm do bordo superior.
Material: Faiança
Época: Início séc. XX (?)
Marcas: Não tem
Origem: Adquirida no mercado português.
Grupo a que pertence: Equipamento culinário.
Função Geral: Recipiente para o consumo de bebidas.
Função Específica: Beber vinho.
Nº inventário: 3635
Objectos semelhantes: Não existem em cerâmica.
Observações:
Os objectos enganadores em cerâmica apresentam-se mais frequentemente sob a forma de jarros. A sua construção é mais complexa e a grande maioria tem um sistema de armazenamento de líquido paralelo que só funciona quando se tapa com os dedos um dos orifícios.
Esta caneca é uma forma enganadora de servir o vinho, levando o consumidor a acreditar que tem mais quantidade do que a que realmente existe. Foi encontrada num local de reunião masculina, entre outros copos, e devia servir de divertimento pela surpresa causada.
Mais frequentes são os copos em vidro com as bases grossas (ver: Objecto Mistério Nº 20 - Penny lick ) que podem ter dois fins: servir para enganar o cliente como sucedia na venda de gelados ou vinho, fazendo crer que a quantidade era superior por reflexão do vidro ou quando utilizado como «copo do anfitrião» evitar que o dono da casa bebesse mais do que a conveniência social indicava.