quinta-feira, 10 de julho de 2014

Os médicos no ensino alimentar

Édouard Pomiane
Em 1904 foi criada em Paris a «Société Scientifique d’Hygiène Alimentaire et d’Alimentation rationnelle de l’homme (SSHA)» que ainda hoje existe.

Esta associação, sem fins lucrativos, destinava-se ao estudo e ensino dos problemas de alimentação e nutrição. Entre os seus fundadores, que actuavam igualmente como professores, encontravam-se nomes como Dr. Armand Hermmerdinger, Dr. Henri Labbé e Dr. Éduard Pomiane, que organizaram um curso de «ensino superior de cozinha».
As aulas teóricas eram acompanhadas de aulas práticas que tinham lugar nas instalações situadas no nº 16 da rua de l’Estrade, sede da sociedade.
E. Pomiane com as alunas numa das aulas
Os fundamentos dessas aulas foram publicados no livro “Travaux pratiques de cuisine raisonnée” escrito pelo Dr Edouard de Pomiane Pozerski (1875-1964). 
Este médico e gastrónomo era filho de pais polacos que emigraram em 1863 para França substituindo o nome polaco Pozerski por Pomiane, com que ficaria conhecido. Entre 1901 e 1919 trabalhou no Instituto Pasteur como fisiologista dedicando-se ao estudo dos sucos pancreáticos e intestinais. As suas múltiplas publicações colocaram-no no que chamavam a «gastrotecnologia», palavra que se aplica à investigação sobre as relações entre a preparação e apresentação dos alimentos e a sua digestibilidade e que, nos nossos tempos, o mais aproximado são as teorias da “cozinha molecular”.
Passando a ser conhecido apenas como “Doutor Pomiane” deu aulas na Sociedade Científica entre 1921 e 1943. Para além de artigos científicos e conferências publicou vários livros de culinária, tema a que se dedicaria em exclusivo após a sua reforma.
Pomiane notabilizou-se também por ser um dos primeiros a fazer difusão radiofónica sobre estes temas na radio Paris, nos anos de 1923 a 1929.

Além dos inúmeros artigos que escreveu Pomiane  publicou os seguintes livros: em 1922, o "Traité d'Hygiène alimentaire" e "Bien manger pour mieux vivre", com prefácio de um outro célebre gastrónomo Ali-Bab, irmão do médico Joseph Babinski, de que já falei (Os dois Babinski).
Em 1929 escreveu ”Cuisine juive. Ghettos modernes”, em que retratava os hábitos alimentares antigos dos judeus polacos que tinha conhecido em Paris.

Seguiram-se outros títulos como "Le code de la bonne chère", "La cuisine en six leçons", "La cuisine en plein air", "Réflexes et réflexions devant la nappe", "Vingt plats qui donnent la goutte", "365 menus, 365 recettes", "La cuisine pour la femme du monde", entre outros.

A importância da sua obra deixa-me pouco espaço para falar do Dr. Armand Hemmerdinger (1879-1946) que partilhava consigo o ensino da «cuisine raisonnée» ou “cozinha fundamentada”, como professor do curso de economia doméstica. Acrescento apenas que é da sua autoria a obra “Vulgarisation des notions d'hygiène alimentaire et d'alimentation rationnelle”, de 1919. 
Outro responsável pelo ensino nessa escola foi o Dr. Henri Labbé, professor agregado da Faculdade de Medicina que, juntamente com sua mulher Madame Labbé, escreveu “Cuisine diététique. Guide pratique pour la préparation des aliments destinés aux malades”, em 1935 e cujos nomes foram perpetuados por um prémio de investigação que se mantém até aos dias de hoje.
Para quem pensa que a cozinha só agora é levada a sério deve pôr aqui os olhos.

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