O pirolito foi uma bebida muito apreciada durante a primeira metade do século XX. Ficou no imaginário dos que a conheceram não só pelo seu gosto, mas também pela forma da garrafa.
Era uma bebida gaseificada, feita á base de um xarope feito com açúcar, água, ácido cítrico e essência de limão, a que posteriormente era adicionado gás carbónico. A receita deste xarope base variava de fábrica para fábrica, constituindo esse o seu segredo. Para quem não a experimentou, pode dizer-se que o mais parecido, hoje em dia, é o Seven-Up.
Hiram Codd (1838-1887)
Apesar do nosso apego à forma da garrafa o seu formato não é português. A garrafa de pirolito foi inventada por um inglês, Hiram Codd, que registou a patente em 1872. Foi criada com o fim de ser usada para bebidas gaseificadas, como a soda, águas minerais, limonadas e foi usada em toda a Europa e Estados Unidos.
O formato da garrafa, também conhecida por «frasco de bola», distinguia-a de todas as outras bebidas gaseificadas. Tinha uma forma cilíndrica na base, encimada por um gargalo cónico, com um aro de borracha na extremidade superior, que se destinava a fechar hermeticamente a bebida por intermédio de uma bola de vidro. Esta bola de vidro transformava-se num berlinde, apreciado pelos rapazes, quando se partiam as garrafas, usados depois no jogo do berlinde. Um estreitamento bilateral no gargalo, como se fosse feito por dois dedos, permita fixar o berlinde, depois de aberta. Para abrir a garrafa bastava carregar no berlinde e este descia para a sua cavidade própria no gargalo. Ao pegarmos numa garrafa de pirolito ouvimos o som inconfundível do berlinde a bater nas paredes da garrafa.
Quando comecei a procurar a fábrica original de pirolitos, descobri que não era possível saber qual foi a primeira. Em Portugal houve inúmeras fábricas de pirolitos, distribuídas por todo o território. Assim, cada pessoa que conheceu o pirolito acha que o da sua zona foi o primitivo.
Mencionarei algumas das fábricas que encontrei numa busca não exaustiva.
Em Aveiro, em 1922, existiam 2 fábricas de pirolitos, de acordo com os jornais regionais. Em Caria existiu uma fábrica de pirolitos. No Barreiro há referência, em 1927, a uma fábrica de Pirolitos de José Gouveia e o mesmo se passou em Estremoz com a Fábrica do Massano. Em Guetim (Espinho) existiu uma fábrica de pirolitos, feitos com a água da Gruta da Lomba.
Na baixa de Coimbra, há cerca de 80 anos existia uma fábrica de pirolitos, no local onde hoje se encontra o restaurante Carmina de Matos.
Nos Açores existiram várias fábricas de pirolitos: a de Francisco Pereira de Vasconcelos, cerca dos anos 30, na Ilha Terceira , a Fábrica da Rua dos Canos Verdes e a de Melo Abreu, em Ponta Delgada.
Há igualmente referência a fábricas em S. Jorge da Panasqueira, no Louriçal, no Alandroal e em Perafita.
Em Sesimbra existiu, em 1935, a Marítima, de Jorge Amaro Reis Neves.
No Redondo existiram pelo menos duas fábricas: a do Botas, que utilizava a água da Fonte da Bicha e a Fábrica de refrigerantes da Serra d’ Ossa.
Na Marinha Grande existiu a Fábrica de pirolitos e gasosas de Antunes & Reis, em 1929, e em Castelo de Vide a fábrica de Olímpio Gonçalves Novo (1899 – 1960). Esta última com uma referência especial pelo estudo que foi feito sobre esta empresa, e que se encontra disponível no site do
Museu de Castelo de Vide.
Também na Venda do Pinheiro, em 1926, Francisco Alves começou a produzir pirolitos, para além de outros refrigerantes. Esta empresa então designada Francisco Alves e Filhos, viria também a produzir a Laranjina C e mais tarde, nos anos 70, a Trinaranjus. Em 1990, foi adquirida pelo grupo Cadbury-Schweppes Portugal, SA.
Na
Lourinhã existiu uma fábrica que era propriedade de José Maria de Carvalho e há referência à existência de duas fábricas de pirolitos no Concelho do Cadaval, uma na própria vila do Cadaval, cerca dos anos 30 e outra, no Vilar, no final dos anos 40.
Esta lista de fábricas de pirolitos mostra-nos que devem ter havido muito mais, uma vez que se tratava de uma produção familiar e cuja distribuição era normalmente regional.
Em comum existiam as garrafas fabricadas na Marinha Grande. Do que nos foi possível constatar existiam vários tipos de garrafas. Embora o modelo seja o mesmo os tamanhos e o tipo de vidro variam ligeiramente. Isto deve-se a que eram fabricadas em várias fábricas. Algumas garrafas não tinham qualquer identificação na base, enquanto outras apresentam as marcas das fábricas em que eram produzidas. Identificamos as seguintes marcas: SB- correspondendo á Vidreira Santos Barosa, RG que se refere à fábrica de Ricardo Santos Gallo, CV à Companhia Industrial Vidreira e ainda as marcas DS e P, que desconheço a que fábricas pertencem.
Nos anos 50, preocupações com a higiene levaram a uma legislação que obrigou os fabricantes a melhoramentos nas suas fábricas e à proibição de utilizar este tipo de garrafa de bola, por ser de difícil lavagem. Com resultado muitas fábricas de pirolitos foram obrigadas a fechar.
Acabaram os pirolitos. Ficou-nos a memória.